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DONA BEIJA, A FEITICEIRA DE ARAXÁ

Ana Jacinta de São José nasceu na região do Desemboque, quando ainda sob jurisdição goiana, no povoado de São Domingos de Araxá. Desde de criança, sua rara beleza foi muito admirada e comparada ao delicado e angelical beija-flor, surgindo de tal associação o apelido de Dona Beija.

Quando tornou-se uma belíssima moça, apaixonou-se por um rapaz da alta sociedade, conhecido pelo nome de Antônio. Mas, também atraiu a atenção de Mota, um ouvidor da Corte Portuguesa, que tornou-se seu amante e protetor. Por influência dela, ele teria determinados a devolução para Minas das terras do Triângulo, que tinham sido transferidas para a capitania de Goiás. Quando ele retornou para Portugal e a deixou, torna-se alvo de muitas fofocas e Jacinta, sem saída, resolve abandonar Araxá.

Muito tempo depois, quando recebe a notícia que seu ex-amor Antônio havia casado com outra, decide voltar a Araxá. Entretanto, as mulheres da cidade, consideravam-na um grande risco para os valores éticos da época e sendo assim, tornou-se uma pessoa indesejada e marginalizada pela sociedade.

Para vingar-se resolveu prostituir-se e tornar-se amante de todos os homens que estavam casados com as mulheres que a condenaram.

Ajudada por seus amigos, construiu uma magnífica casa de campo, com o intuito de ali instalar um luxuoso bordel, conhecido como a “Chácara do Jatobá”. Dona Beija, como passou a ser conhecida, deitava a cada noite, com um homem diferente se este lhe pagasse bem, mas à condição de poder decidir com quem dormir. Ela se tornou célebre, atraindo os homens das regiões mais remotas, para conhecer os seus encantos: esses a cobriram de dinheiro, jóias e pedras preciosas.


A lenda conta a existência de uma “Fonte da Jumenta”, água miraculosa, que concedia juventude, saúde e beleza a Dona Beija e onde ela banhava-se todos os dias. Atualmente, a cidade de Araxá é famosa devido às águas termais, fonte de vigor e rejuvenescimento.
 

Conta-se que Dona Beija jamais esqueceu Antonio e que permaneceu sempre o seu grande amor. Uma noite, movido pela embriaguez, invadiu a “Chácara do Jatobá” e D. Beija terminou por escolhê-lo, dormiu com ele, engravidou e deu luz a uma menina.

Todavia, Antonio jamais abandonou a sua esposa, Aninha. Há muito tempo, o pai de Antonio, revoltado com o caso amoroso entre o seu filho e Dona Beija, adoecera e, antes de morrer, pediu-lhe para que casasse com Aninha. A vontade do pai seria realizada, mas Aninha, era infeliz, pois sabia que Antonio preferia Beija.

Após a morte do pai, a mãe de Antonio cultivara um ódio profundo por Beija, pois sabia que essa era a causa dos desregramentos do filho. Antonio, não podendo aceitar o sucesso de Beija junto aos outros homens, desencoraja-se e abandona o trabalho na fazenda da família.

A mãe de Antonio, um dia, deu um veneno a um dos escravos de Dona Beija, para que esse a matasse. Mas, desejando ter a linda Senhora nos braços, o escravo mudou de idéia e lhe contou a verdade. Beijao aceitou na cama e ele salvou a sua vida. Em seguida, foi Dona Beija quem ordenou para que matassem Antonio. Ela, por causa disso, foi à justiça, mas seria libertada com a ajuda dos seus fiéis amigos. Enfim, Beija decidiu partir de Araxá com a filha e, assim nasceu uma lenda.

Foi a partir de 1940 que ficaram mais claras as evidências em torno da construção do mito Dona Beija. Desde então, o nome e a beleza de Ana Jacinta de São José são associados ao clima da instância hidromineral. Suas águas e, principalmente, a lama termal.

A água é considerada o órgão sensorial que dá sensibilidade e receptividade à terra. Sob a confluência dos efeitos de rotação da Terra e da força da gravidade, é a água que molda a superfície terrestre.

A veneração da água desempenhou um papel importante em várias culturas e religiões, pois todas as grandes civilizações nasceram e cresceram à margem de grandes rios. Citemos o Tigre e o Eufrates, na Mesopotâmia, o Nilo no Egito, etc.

O ciclo da água e seu "eterno retorno" é que torna a terra fértil e fecunda e não seca e estéril. Por essa razão, é uma verdadeira fonte de vida e ao bebê-la ou mergulharmos nela, regeneramo-nos. As águas termais e minerais, como as de Araxá, são famosas por seu efeitos terapêuticos. A algumas, inclusive, foram atribuídas propriedades mágicas, como a água da eterna juventude.

Em todos os tempos, o aparecimento de uma fonte era considerado sagrado, um fato sobrenatural, que encontrava-se sob a proteção da Tríplice Deusa Mãe. Entre os celtas os principais rios da Europa ocidental foram dedicados à Deusa da fertilidade. O rio, o lago, a fonte, os poços e o arroio, são expressões vivas da Terra Mãe, que os santifica e os dota de poderes curativos, através da combinação de diferentes minerais, vegetais e propriedades etéreas que emanam de alguns desses mananciais.

Na psiquê humana a água lembra o útero materno, aquático pouso do embrião, espaço noturno do feto.


 

RESGATE DO FEMININO

NAS TELENOVELAS BRASILEIRAS

Certamente o mito em torno da figura de Dona Beija, faz parte da história das riquezas do Estado de Minas de Gerais, e do Brasil. A adaptação do livro "Dona Beija, a Feiticeira de Araxá”, de Tomás Leonardo & Carlos Heitor Cony, para a televisão, em 1986, foi uma realização importante, dentre outras coisas porque atualizou os símbolos que animam o imaginário feminino.

Dona Beija constitui uma espécie de arquétipos da mulher sexualmente liberada que, ainda em nossos dias, demarca a convergência de sensibilidades em torno de uma ética autônoma, particular e dissonante, no conjunto das moralidades prevalentes de cada época. Talvez a história de Dona Beija não tivesse tal repercussão se não fosse inscrita num contexto social de moralidade fechada, coercitiva, burguesa; entretanto, a inscrição da história num contexto de interesses tão divergentes, imprime o relevo da narrativa.

Toda a mulher, tanto como a de hoje, como a de ontem, quando conhece e vivencia o amor, cresce em confiança e em auto-estima. E, há uma redução gradual na inibição que precede a evocação da ativação ou o "nascimento" do arquétipo da Deusa Afrodite, anunciado pelo primeiro orgasmo na relação sexual e por um novo desejo de intimidade física. O corpo toma-se de desejo, que nem ele mesmo sabia que o tinha.

E, depois da primeira vez, toda a mulher sabe que será arrastada em direção à intimidade sexual para repetir a experiência, uma vez, que agora, seu corpo será atraído pela paixão rumo à libertação orgásmica.

Tais sentimentos e emoções, não são feios nem sujos, pois representam o ímpeto para a continuação da espécie. Coincidindo com o instinto procriativo, algumas mulheres sentem a influência do arquétipo de Afrodite mais intensamente na época da ovulação, ou seja, quatorze dias antes da menstruação, quando é provável que o sexo conduza à gravidez. É também, quando estão mais sensíveis sexualmente e têm sonhos eróticos, ou quando mais sentem falta de sexo se estão sem parceiros sexuais.

Jacinta, a nossa Dona Beija, como todas as mulheres que possuem o arquétipo da Deusa Afrodite muito ativo, pode tornar-se desacreditada por outras mulheres, por puro ciúmes, inveja e medo de perda, pois sempre verão seus maridos reagindo a ela com muita animação. O sentimento de inveja ocorre em uma pessoa que é incapaz de aceitar sua personalidade ou limitações, que torna difícil a reflexão. Já o ciúmes trabalha em uma faixa de atuação que vai desde a possessão até a repressão. Foi o ciúmes que levou as mulheres de Araxá a reprimir a carnalidade de Dona Beija.

A maioria dos homens ainda buscam em suas parceiras uma mulher idealizada, projetando sobre ela atributos da Mãe Divina Cristã: beleza, bondade, castidade e amor revigorante. No início do amor e do desejo, tudo serão "flores", mas quando a "realidade" se insinuar nesse Jardim, todas as projeções cairão por terra.

Do mesmo modo, para a mulher apaixonar-se é sempre resultado de uma projeção, a personificação do seu próprio potencial inconsciente. Quando os parceiros não vivem de acordo com essas exigências, a projeção não pode ser mais sustentada e pergunta-se então: "O que eu via nele (a)?"

Dona Beija é a imagem arquetípica de  alguém que alcançou profunda conexão com a Deusa do Amor. Assim sendo, através de desenvolvimento psicológico, conseguiu conscientemente conhecer o lado espiritual do seu erotismo e viveu-o na prática, de acordo  com suas circunstâncias individuais. É possível encontrarmos esse tipo de mulher em todos os tempos e em todas as esferas sociais. Ela é livre dos confinamentos da convenção e vive sua vida de acordo com sua própria escolha. Ela é a imagem radiante e estimulante do Feminino que leva o homem a valorizar aspectos de si mesmo que envolvem espiritualidade erótica.

Texto pesquisado e desenvolvido por

ROSANE VOLPATTO