O CAPÃO DA TRAIÇÃO  (1709)

Em todo o território mineiro, próximo de São João del Rei encontramos O Capão da Traição. É neste local onde encontraremos as lembranças de um episódio muito horrendo e sinistro, como o próprio nome está indicando.

A traição mais vil e negregada de que ainda está na memória e na história de Minas Gerais que foi praticada nesse sombrio recanto. Cerca de 300 anos se passaram, ou seja, três séculos, e o nome de Capão da Traição não se apagou, nem nunca se apagará da tradição.

A capitania de Minas Gerais era nessa época assolada por uma Guerra conhecida como Guerra das Emboabas, travadas pelos filhos deste país contra os forasteiros que tinham o apelido de emboabas. Foi-lhe posto esse nome, que na língua indígena quer dizer "pinto calçudo", porque os portugueses usavam comumente umas botas de cano alto.

Depois de muitas peripécias, os nossos, resolvidos a expulsar os forasteiros do rio das Mortes, cercaram o arraial da Ponta do Morro. Tiveram, porém, de desistir do cerco, porque eles vieram em um número superior de homens.

Por conta disso os nossos, depois de levantado o cerco, deliberaram retira-se, seguindo a caminho de São Paulo.

Em sua retirada, aconteceu que um pequeno bando, distanciado de seus companheiros, procurou abrigo num capão de mato, que ficava no meio de uma campina banhada pelo rio das Mortes.

O comandante dos forasteiros era um indivíduo de má índole, cuja vida se tornara uma série de crimes e depravações. Chamava-se Bento do Amaral Coutinho, e tinha o posto de sargento-mor.

Este mandou que um de seus subordinados fosse ao Capão fazer um reconhecimento. O enviado foi. Lá chegando, receou oferecer combate aos nossos e, com medo, retirou-se sem disparar um tiro. Então os nossos, achando graça de tamanha covardia, promoveram-lhe formidável vaia.

O sargento-mor, ao saber do ocorrido, exasperou-se e foi em pessoa, à frente de numerosa tropa, oferecer combate.

Assim que os nossos pressentiram a sua chegada, cada um se empoleirou em uma árvore com seu trabuco na mão. Rompeu fogo. Os emboabas sofreram muitas baixas, porque a pontaria do inimigo era certeira. Quanto aos nossos, nenhum tiro os atingiu, pois não podiam ser vistos, encoberto pelos galhos das árvores.

Irritado, o sargento-mor resolveu cercar o capão, para que os nossos se rendessem pela fome e pela sede. Depois de dois dias e duas noites sem comer ou beber, os nossos resolveram render-se. Escolheram para portador da paz um homem velho e de todo respeito, que já de longe ia acenando com uma bandeira branca, simbólica da trégua.

O sargento-mor recebeu-o com mostras aparentes de grande alegria, chegando até a abraçá-lo e a dar-lhe de comer e beber.

O portador explicou que os nossos estavam prontos para fazer a paz, desde que sua vida fosse garantida. O sargento-mor jurou pela Santíssima Trindade que pouparia a vida aos nossos, mas exigiu que lhe fizessem a entrega das armas.

Regressou o portador para junto de seus companheiros com a notícia da aceitação da paz. Os nossos, confiando na palavra de Amaral Coutinho, não demoraram para apresentar-se e fazer a entrega das armas.

Isso feito, e logo que apanharam o inimigo desarmado, o sargento-mor, faltando com sua palavra de honra, violando as leis de guerra e perpetrando a mais negra covardia e a mais refalsada vileza que se possa imaginar, mandou que seus comandados abrissem fogo sobre os inimigos.

Assim foi feito, para vergonha e eterno descrédito de seus autores. E nada menos de trezentos dos nossos foram imolados, ficando o campo juncado de cadáveres...

É por isso que ainda hoje, quando o povo enfrenta o lugar onde se desenrolou essa matança, desvia os olhos e murmura, estremecendo ainda de cólera e de horror:

- Capão da Traição....Capão da Traição...

A GUERRA DOS EMBOABAS

Luta travada em Minas Gerais, na primeira década do séc. XVIII . Envolveu paulistas, pioneiros no descobrimento das minas de ouro, e emboabas (a maioria eram portugueses), termo que designava todos os forasteiros não-paulistas que afluíram para a área a fim de fazer fortuna. . 

Em 1708, os paulistas reivindicavam exclusividade de mineração, entrando em choque com novos exploradores vindos das capitanias do norte, do leste e do sul. Assim inicia-se um conflito. A Guerra dos Emboabas é o único movimento do Brasil Colônia no qual há participação da classe média.

Essa guerra estendeu-se de 1707 a 1709.

Texto pesquisado e desenvolvido por

ROSANE VOLPATTO