A
brincadeira do Boi existe no folclore brasileiro
com diversos nomes: bumba-meu-boi, boi-bumbá,
boi-de-reis, boizinho, boi-da-cara-preta,
boi-pintadinho, etc. Conta-se que certa vez, em
Santa Catarina, com pressa de se fazer uma cabeça
para um boi de pano, foi usado um mamão verde, o
que levou a denominar-se desde então de
boi-de-mamão. Mas há quem contrarie essa versão
dizendo vir o nome boi-mamão do boi que mana.

DO BUMBA-MEU-BOI À BOI-DE-MAMÃO
Apesar dos
muitos estudos sobre o assunto, ainda existem
dúvidas sobre o surgimento da primeira brincadeira
do boi na ilha de Santa Catarina. Acredita-se que
tenham sido os nordestinos que fizeram sua
transposição para a ilha. Mas Câmara Cascudo
registra no Dicionário do Folclore Brasileiro:
"Houve também na Espanha e Portugal os touros
tingidos, feitos de vime e bambu, um arcabouço de
madeira frágil e leve, recoberto de pano, animado
por um homem no seu bojo, dançando e pulando para
afastar o povo e mesmo desfilando diante dos
Reis."
O
primeiro registro em Santa Catarina desta folia é de 1871, contada por
José Boiteux, em seu livro “Águas Passadas”, onde descreveu uma dança
realizada em Desterro (antigo nome de Florianópolis). Antigamente a
brincadeira era conhecida como “Boi de Pano”, mas com a pressa de se
fazer à cabeça foi utilizado um mamão verde para fazer a cabeça do
boi, daí seu nome atual.

Entretanto, em 1840, em Pernambuco, o
padre Lopes Gama registrava, no periódico de sua propriedade, "O
Carapuceiro", a presença de certo folguedo dizendo:
"De quantos recreios, folganças e
desenfados populares há nesse nosso Pernambuco, eu não conheço um tão
tolo, tão estúpido e destituído de graça como o, aliás, conhecido
Bumba-meu-boi. Em tal brinco não se encontra um enredo, uma
verossimilhança, nem ligação; é um agregado de disparates. Um negro metido
debaixo de uma baieta é o boi; um capadócio enfiado pelo fundo de um
panacu velho, chama-se o cavalo-marinho". E o padre Lopes da Gama
continuava verberando os seus impropérios contra o tal bumba-meu-boi, que
ele vai descrevendo nos mínimos detalhes...
Com esse registro e a notícia de José
Boiteux há uma diferença de 31 anos. Considerando-se a precariedade das
comunicações dessa época, podemos concluir que realmente foram os
portugueses que transpuseram para a ilha do Desterro o bumba-meu-boi,
dando razão a Câmara Cascudo.
No município de Laguna, o pesquisador
Rubem Ulysséa encontrou dentre os personagens do Boi-de-mamão, o Mateus
que dança acompanhado da Mãe Catarina, sua mulher. É bom lembrar, que no
bumba-meu-boi do Nordeste existe a figura de uma mulher chamada Catirina,
uma razão a mais para se acreditar que antes de ser boi-mamão, era
realmente bumba-meu-boi.
Doralécio Soares, em suas pesquisas
de campo, encontrou em 1968, em Jaguará do Sul, um bumba-meu-boi onde
quase todas as figuras se apresentavam em duplas. Dois bois, dois
cavalos-marinhos, duas bernúncias, dois cabritos, duas onças, macacos,
casal de vovôs, Satanás, casal de dongola (galinha), casal de Mariola, Nhô
Bastião, Nhô Zaru, Sarará, Bicho Sugão, bruxas e outros. Também encontrou
a seguinte cantoria:
"O meu boi morreu
O que será de mim
Vamos buscar outro, ó maninha
Lá no Piauí".
Esse é um verso encontrado no
bumba-meu-boi do Nordeste, dando claras evidências que a brincadeira
chegou à Santa Catarina trazida na bagagem dos nordestinos, até que surgiu
a versão catarinense.
Do Bumba-meu-boi ou boi-de-pano para
o boi-de-mamão, não se sabe ao certo o ano em que houve a mudança do nome,
mas que aconteceu, isso não se discute. Mas, não só o nome mudou, como
também houve a introdução de novas figuras. Essas são as mais diversas,
procurando os criadores sempre embelezar o auto das apresentações.

O
BOI DE MAMÃO VERDE
O
Boi-de-Mamão é hoje, uma das manifestações mais populares do litoral
Catarinense,
revela em sua manifestação um auto dramático, encenado com
alegre coreografia e ao som de uma cantoria contagiante que encanta e
envolve crianças e adultos. É
uma versão catarinense dos folguedos do bumba-meu-boi tão conhecido no
Norte e Nordeste do Brasil.
O
auto popular do "Boi-de-mamão" nos lugares onde predominam os
descendentes lusos, os chamados descendentes italianos ou de teutos, de
brasileiros ou caboclos, ou, onde o estrangeiro aquelas festividades próprias
do luso ou do seu descendente. O boi sempre foi festejado por ser uma
importante figura como força de trabalho para os engenhos e para os
transportes.
Quanto
à época da sua realização há variantes, em que se enquadram todas
dentro do período que vai do Natal ao Carnaval.
Em
algumas localidades, como na colônia Maria Luíza, foram incorporadas á
festa do boi catarinense as danças do pau-de-fitas e das balainhas, para
introduzir o folguedo, antes da presença do boi.
A história do auto conta o drama
do boi que fica doente, morre e é ressuscitado, para a alegria dos
participantes. Ela se divide em cenas, cada qual com música, letra e seu
personagem central próprio.

HISTÓRIA DA ORIGEM DO
NOME
A história do Boi-de-Mamão
iniciou-se quando um menino foi até a venda comprar bolacha e biscoitos
para sua mãe tomar café às 6 horas da tarde.
Outro menino, um vizinho, enquanto
isso, preparou um mamão maduro bem grande, fez dois furos, amarrou um
cordão no pé do mamão e acendeu um pedacinho de vela dentro da fruta. E,
quando o outro menino ia passando com o biscoito e a bolacha, ele puxou o
cordão, dando um enorme susto no garoto, que jogou para o alto suas
compras e saiu em disparada. Entrou em sua casa, gritando como louco:
-"Um boi de mamão, um boi de
mamão!...."
A mãe, sem saber do acontecido e
com pena do filho, foi até a vizinha pedir uma explicação. Essa não tardou
em explicar que:
-"Foi o meu menino que pegou um
mamão bem maduro, bem vermelho por dentro, fez dois furos, acendeu uma
vela dentro dele e pregou o maior susto em seu filho".
Nesse momento, os dois meninos
passaram a brigar, mas as mães conseguiram separá-los, prometendo realizar
um outro tipo de brincadeira de Boi. Costuraram um Boi de pano que levou o
nome de Boi-de-Mamão. Um dos meninos era o vaqueiro e o outro brincava
vestindo a roupa do Boi.
Em seguida, atraído pelas risadas
da brincadeira, chegou mais um menino que quis participar. Ficou sendo o
Mateus. Chega então uma menina, que acabou assumindo a personagem
Maricota. Mas daí, foram se chegando outros meninos da comunidade. Um
brincou debaixo da fantasia de urubu, que deve beliscar o boi quando ele
morre. Outro vestiu o cavalinho, que deveria laçar o Boi e, foi assim que
nasceu essa maravilhosa e alegre brincadeira que ainda hoje, percorre
cantos e recantos, desdobrando-se em diferentes espaços, ocupando as mais
variadas caras e jeitos.

RENASCENDO À CADA ANO
O Boi-de-Mamão é uma brincadeira
muito popular, que continua sendo realizada anualmente. O Boi já morreu e
renasceu em muitos momentos históricos, mas não devemos nos esquecer, que
ele renasce sempre nas mãos das pessoas, que vêm carregadas de seus
desejos.
Esse Boi exige, some, reaparece,
se curva, vai brincando com a vida e alegrando os corações de crianças e
adultos.
O Boi-de-Mamão que está ainda por
aí, é um boi brincante que nos ensina que todos podemos ter esperanças de
dias melhores.
Ele é um Boi para ser sentido,
olhado, mas também para ser vivido.

FIGURANTES
e EVOLUÇÃO DO FOLGUEDO

Entre
os figurantes do auto temos:
O
"vaqueiro", chefe do bando, que é assim denominado no Vargedo,
em outros lugares é conhecido como "Chamador", ou ainda por
"Mateus". Ele vai sempre a frente, tendo à mão um bordão para
chamar o "boizinho". Nas cidades de Joinville e Florianópolis o
Mateus é uma espécie de palhaço que utiliza máscara e ajuda o médico a
salvar o boi. Ao lado de outros figurantes, Mateus teatraliza o espaço
vago das apresentações e é a figura de maior destaque no quadro da morte
do boi.

O
elemento principal como o próprio nome indica é o boi, portanto,
personagem obrigatório. Consiste em uma armação de madeira, sobre a
qual estendem um pano grande, branco ou preto, com remendos da cor,
imitando as manchas do couro do boi natural. Sob a armação vai o
"brincador" (como o chamam). Ao boizinho dão um nome qualquer:
Pintado, Malhado (Boi Pampa), etc. A não ser na hora em que brinca, o boizinho mantêm-se
deitado. Atende só aos chamados do "Chamador", seu patrão. O
"brincador" é mudado, de vez em quando, para não cansar. Há
localidades, como em Jaguará do Sul, que existem bois chamados de Surtão
ou Jaraguá (metade preto e metade branco), que é um tipo de bernúncia, que
brinca de pé com um só personagem, com a mesma bocarra, sem cantoria
própria, apenas citada na cantoria dos bichos.
Encontramos também, com a
mesma persistência o "Cavalinho" (para homenagear o tropeiro que guiava a
boiada) com exceção
da localidade de Lajeado, onde não aparece.
A
"Cabra", aparece, tão somente nos autos do Rio das Pedras e de
Capivara e Conquista.
Há o marimbondo miudinho, com asas e
tudo, com cantoria própria, o Cururu, o cachorro, que espanta o urubu
quando este vem pinicar o boi doente, o macaco a virar cambalhotas pelo
terreiro afora, o urso que comeu o milho do roçado e, sempre recolhendo
dinheiro, a Jaruva, o leão, o jacaré e a girafa.

A
"Bernúncia"(um tipo de dragão que engole gente) é totalmente catarinense,
mas que segundo alguns estudos, seria uma estilização do dragão chinês,
trazida para nossa cultura pelos imigrantes. O primeiro registro desse
personagem foi realizado na cidade de São José, próximo a Florianópolis, a
partir de 1920. A Bernúncia é um bicho medonho, guiado pelos dançadores
que ficam serpenteando debaixo do seu corpo de pano. A figura é uma
espécie de gigantesca cobra de tecido com uma enorme cabeça de papelão que
anda entre os participantes abrindo e fechando sua bocarra, em busca de
alguém para engolir. Quem é comido, passa a fazer parte do corpo do bicho,
aumentando seu tamanho. Parece estar associada às histórias do bicho-papão
ou da cuca que gosta de sair atrás das crianças para comê-las. Algumas
vezes é apresentado o Barão, o parceiro macho da Bernúncia, com aspecto
maior e mais fantasmagórico. A boca cheia de dentes e o corpo coberto de
barba-de-pau presa ao pano dá ao personagem um aspecto monstruoso.
Também encontramos a
gigantesca Maricota, que pode ser chamada de Tiroleza em algumas
localidades. A Maricota é uma armação de madeira, com uns três metros de
altura, tendo por dentro um cruzamento entre a armação que é acolchoada, a
fim de ficar sobre os ombros da pessoa que brinca dentro dela. No centro
da armação alguns colocam um pau, com o qual o brincador mantém o
equilíbrio da figura. O rosto é uma máscara com a fisionomia de mulher, de
dimensões exageradas. Os braços são soltos e em uma das mãos carrega uma
bolsa. Com os movimentos do dançador, os braços se abrem e,
propositadamente, atingem as pessoas. O vestido que cobre a armação é de
chita estampada berrante. Das orelhas pendem brincos enormes.
Doralécio nos conta que encontrou em
uma encenação do boi em Imbituba outra figura de uma mulher gigante
chamada de Saborosa. A cabeça e o rosto eram de porongo. Os olhos, a boca
e o nariz eram abertos, forrados com papel vermelho transparente. No seu
interior haviam colocado uma vela acesa, de maneira que de longe dava a
impressão de que a boneca estava viva, considerando-se que essas
brincadeiras são realizadas sempre à noite.
"Palhaços"e
"Mascarados" são encontrados nos folguedos de Lajeado. Estes são
trajados com roupas velhas, máscaras e bordão. Os mascarados são
incumbidos de pedir esmolas aos donos das casas que visitam. Toda a
receita arrecadada, muitas vezes, são oferecidas à Igreja local.
O
"Doutor", tem funções de benzedor, pois com um galhinho
qualquer diz:
"Eu
benzo este boi
Com
um galhinho de manjericão
O
dono da casa
Tem
que pagar um patacão!"

Eis
algumas letras das cantorias dos trovadores repentistas:
"O
meu boi é de mamão!
Coro:
É sim, senhor!
Ora
bumba, meu boi
Coro:
Lá vai o boi!
Ó
meu cavalinho
Entra
cá prá dentro
Que
o dono da casa
Já
te deu licença
O
meu boi é de mamão! etc...etc..
Ó
meu cavalinho
De
sela amarela
Não
namora as moças
Que
elas são donzelas!
O
meu boi é de mamão! etc...etc..
Brinca
Bernúncia, brinca
Ela
brinca bem.
Se
não brincar direito
Ela
aqui não vem.
O
meu boi é de mamão! etc...etc.."

"Eu
vou sair pela cidade/Vou usar
minha razão/Eu vou mudar esta história
Com o meu boi de mamão/Vou acabar co’esta tristeza/De ver meu povo
chorar
Eu quero ver muita folia/Quero ver meu boi brincar
É
a maricota dançando na rua/Mostrando que a luta não pode parar
É o jaraguá com a meninada/É o povo unido no mesmo lugar
É o vaqueiro na peça do boi/Aprendeu com a vida não pode errar
Oi abram alas minha gente/Que a bernuncia quer passar
Eu
vou botá meu boi na rua/Quero ver meu boi brincar.


A
brincadeira aborda um tema épico (a morte e ressurreição do boi).
Apresenta a pantomima das investidas do boi, a sua morte, a encenação da
cura, envolvendo todos os personagens, culminando com a ressurreição do
boi.
A “cantoria”
acompanha toda a apresentação cantando versos alusivos às figuras
e à dramatização. Os instrumentistas são três, normalmente tocando
um violão, um cavaquinho e um pandeiro.
O
folguedo do Boi-de-mamão é uma das manifestações mais
significativas da cultura popular catarinense. Está presente nos
municípios do litoral e principalmente em Florianópolis, Capital
de Santa Catarina, onde concentra o maior número de grupos.


UM
BRASIL DE MUITOS PAÍSES......

Este
é o nosso Brasil, terra de "festança" o ano inteiro, de todos
os jeitos e para todos os gostos.
É
bumba-meu-boi no Norte e no Nordeste. É Boi-de-mamão no litoral de sol e
magia Catarinense, que transforma o povo e as ruas em quadros de pura
alegria e exaltação da vida.
Entremeado
de culturas, o Brasil é terra de muitos países.....
Lugar
de transformação contínua, que nos devolveu em seiva e encantos os
corpos que lhe confiamos. Aqui se vive, se canta e se encena a miscigenação
das raças, no embalo de esperanças animadoras e iluminadas, que são
nossas tradições e costumes e que refletem a riqueza da imaginação de
nosso povo.

Um Brasil de muitos
países....terra de sons mágicos, ritmos de encantamento, de filhos
amados e hospitaleiros, de lucilante seduções e magnificente
colorido...Oásis para ambiciosos audazes, onde aportaram culturas
diferentes e de desconcertante requinte.
Venha, a mesa está
posta! Pratos decorados com sedutoras heranças já estão servidos.
Sente-se e desfrute deste maravilhoso arsenal de raízes etnicas,
aureoladas de glória e saber profundo.