 AS
GÓRGONAS

As
três Górgonas, originalmente, tinham
rostos muito belos e corpos bem
delineados, além de apresentarem
graciosas asas douradas arqueadas por
sobre os ombros. Essas irmãs, filhas
imortais de Fórcis (o
"Grisalho", filho do extremo
Ocidente) e Ceto (os dois são
divindades marinhas), chamavam-se
Medusa ("a ladina"), Esteno
("a forte") e Euríale
("a que corre o mundo").
Medusa provocou a ira de Atena ao
fazer amor com Poseidon (deus do Mar)
em um dos santuários desta.
Enfurecida, Atena tornou-a mortal e a
transformou, e às suas irmãs, em
feias megeras , as
"Repugnantes". Tinham a pele
escamosa de um lagarto e cobras
silvantes por cabelos; sua língua era
protuberante, cercada por presas de
javali. Medusa era a mais feia e
petrificadora das três.
O
terrível olhar das Górgonas era tão
intenso que transformava os mortais em
pedra e por toda a volta da caverna em
que viviam podiam-se ver figuras de
homens e animais que tinham olhado
casualmente para elas e foram
petrificados por essa visão. Podemos
vê-las nesse sentido, como figuras
guardiãs, protetoras das fronteiras
dos antigos mistérios primais,
guardiãs do limiar. Robert Graves,
entre outros, sugere que as
sacerdotisas usavam, máscaras de
Górgonas para afastarem os
não-iniciados. Cabeças de Górgonas,
na forma de grotescos entalhes, eram
colocadas com freqüência nos muros
das cidades gregas para aterrorizarem
os inimigos, um exemplo de proteção
de fronteiras pelo arquétipo das
Górgonas.

As
Górgonas viviam juntas no além-mar,
na extremidade ocidental do mundo e
seu santuário formava fronteira com o
reino da Noite. Eram protegidas por
suas irmãs mais velhas, as Gréias,
que possuíam um único olho e um
único dente que compartilhavam,
passando-os uma para as outras.
A
mitologia masculina posterior fala do
herói Perseu, que, enviado numa
missão suicida para trazer a cabeça
de Medusa, atraiu a simpatia e ajuda
de Atena. Com sua ajuda e com o
empréstimo de sandálias aladas, um
elmo de invisibilidade e um escudo
brilhante, Perseu penetrou no reino
das Górgonas. Encontrando-as
adormecidas, ele delas se aproximou,
protegido pelo elmo da invisibilidade
e, caminhando de costas, olhando
apenas para o reflexo da cabeça de
Medusa em seu escudo, pôde
decapitá-la com a espada guiada por
Atena, e escapar. Ele levou a cabeça
guardada em segurança em uma bolsa
mágica e a deu de presente a Atena,
que a pendurou no cinto ou, como dizem
outras versões, fixou-a no centro da
égide do seu escudo. Não só Atena
usava a imagem da Medusa como tótem
protetor contra os inimigos e todo o
mal. Sua imagem era encontrada em
cerâmica, jóias, portas e carregada
pelos soldados nos campos de batalha.

O
mito de Perseu e a luta com a Medusa
simbolizam a guerra íntima do ser
humano na procura por si próprio.
Quem vê a cabeça da Medusa é
petrificado: é a conscientização,
por parte do homem, do seu lado
negativo, é a descoberta do peso
petrificante de sua culpa.

O
nome Medusa significa " sabedoria
feminina soberana, " em Sanscrito
significa Medha, Metis em griego e em
egípcio, Met ou Maat.
A
Medusa foi trazida para a Grécia da
Líbia, onde as Amazonas líbias a
adoravam como a Deusa Serpente. A
Medusa (Metis) correspondia ao aspecto
destruidor da Grande Deusa Tríplice
Neith também chamada de Anath, Athene
ou Athenna na África do Norte e
Athana em1400 a.C., em Minos Creta.
A
Medusa tinha originalmente o aspecto
da deusa Atena da Líbia onde ela era
a Deusa Serpente das Amazonas. Seu
rosto era oculto e pavoroso. Estava
escrito que nada nem ninguém poderia
levantar seu véu, e todo aquele que
se atravesse a fazê-lo morreria
instantâneamente. Foram os gregos que
separaram Medusa de Atena e as
tornaram inimigas.

Dando
continuidade a nossa história...,
mesmo após a sua morte, o sangue da
Medusa conservou seus poderes e deu
vida ao famoso Pégasus, o cavalo
alado, obediente à Zeus. O sangue da
Medusa é totalmente extraído de seu
corpo e utilizado então, mais tarde,
transformando Asclépio em um grande
curador. Foi exatamente Atena quem deu
a Asclépio dois frascos do sangue de
Medusa. Venerado como fundador da
medicina, Asclépio era habilidoso na
cirurgia e no uso de remédios. Ele
usou o sangue do lado esquerdo de
Medusa para levantar os mortos; o
sangue do lado direito provocava morte
instantânea. Na verdade, Asclépio
preferia trabalhar apenas com a
capacidade curativa dos remédios. Mas
o fato de o sangue de Medusa poder
tanto curar como matar demonstra que a
figura da Medusa ou da Górgona não
era estritamente negativa e
destruidora, tendo em si forças
curativas positivas, o que lhe dava
equilíbrio.

O
sangue mágico da Medusa se
correlaciona ainda, com um antigo tabu
relacionado com a menstruação. Povos
primitivos acreditavam que o olhar de
uma mulher menstruada poderia
converter em pedra um homem. Também
era crença popular que o sangue
menstrual era fonte de toda a vida
mortal e também da morte, pois ambas
são inseparáveis.
As
Górgonas aladas, cujos cabelos eram
serpentes que também cingiam a sua
cintura, juntamente com as presas dos
javalis, a barba e a língua à
mostra, são símbolos urobóricos do
poder primordial do Grande Feminino,
imagens da Grande Divindade Materna
pré-helênica em seu aspecto
devorador, como terra, noite e mundo
inferior.
A
acentuação urobórica
masculino-feminina da Górgona não
resulta somente da impressão causada
pelas presas ferozes, mas também da
língua estendida para fora, a qual,
em contraste com os lábios femininos,
sempre tem um caráter fálico. Na
Nova Zelândia, a exibição da
língua estendida é sinal de poder e
de energia dinâmica. Onde quer que
surja o aspecto terrível do Feminino,
ele também será a mulher-serpente, a
mulher com o falo, a unidade
conceber-gerar da vida e da morte. Eis
a razão pela quel as Górgonas são
dotadas de todos os atributos
masculinos: a serpente, as presas do
javali, o dente, a língua exposta e,
às vezes, até barba.

AS
GÓRGONAS COMO ARQUÉTIPOS

As
Górgonas são tidas históricamente
como arquétipos da "Mãe
Repugnante", ou "Mãe
Terrível". Entretanto elas simbolizam
bem mais do que só isso, representam:
a sabedoria feminina soberana; os
mistérios femininos; todas as forças
da Grande Deusa primordial; os ciclos
do tempo presente e futuro; os ciclos
da natureza como vida, morte e
renascimento. Elas são criatividade e
destruição universais em
transformação eterna. Elas são
guardiãs dos umbrais e mediatrizes
entre os reinos do Céu, da Terra e do
Mundo Inferior. Elas fazem a conexão
do Céu com a Terra; destróem para
construir, alcançando assim o
equilíbrio. Elas purificam e curam.
Elas são a última verdade da
realidade e da integridade.
São
as Górgonas com sua terrível
aparência, que nos alertam contra a
imersão prematura nas sombrias
profundezas do nosso mundo inferior
psíquico, o nosso domínio
inconsciente. Se penetrarmos nesse
reino sem a preparação adequada,
podemos ficar petrificados, ter a
vontade paralizada e perder a
capacidade de compreender as forças e
os tenebrosos poderes do nosso
inconsciente. Seríamos reduzidos a
uma completa inatividade da alma.

As
Gógonas surgem das profundezas das
cavernas do mundo subterrâneo para
nos desafiar com um grande enigma. As
Desafiantes deste Lado Obscuro fazem
parte da Grande Deusa e estão
vinculadas a Deusa Anciã, que
juntamente com a Deusa Virgem e a
Deusa Mãe, participam do arquétipo
da Deusa Tríplice. A Deusa Anciã e
as Górgonas expressam energias
iniciáticas, curadoras e libertadoras
da sabedoria feminina. Nos relatos
mitológicos elas tornam-se
demoníacas em virtude das religiões
patriarcais que purgaram da
consciência da mulher qualquer tipo
de poder mágico e transformador. A
decapitação mitológica da Medusa
simboliza o silêncio da sabedoria e
da expressão feminina. É um ato que
freia seu crecimento, limita seu
potencial, movimento e contribuições
culturais. A sabedoria feminina é um
dos aspectos mais reprimido nas
mulheres, produto de uma larga
prédica contra o xamanismo das
sacerdotisas, bruxas, curadoras e
profetizas. Nós mulheres ainda
guardamos na memória a perseguição
e queima das bruxas européias e ainda
hoje, qualquer coisa que esteja
associada ao poder das bruxas é
percebido com muito temor e como algo
perigoso e obscuro pelo homem.
Entretanto, as energias da Deusa
Anciã nos dota de força, sabedoria e
dignidade. As anciãs sábias das
culturas matriarcais aborígenes não
foram mulheres submissas porque haviam
encontrado o seu verdadeiro
"Eu" através das
iniciações, ritos de passagem e
consciência madura.

As
histórias míticas das Górgonas
propocionam um ponto de partida para
se detectar as qualidades e energias
internas em cada mulher. Qualidades
das bruxas, xamãs, profetizas e
sacerdotisas que se desenvolveram em
distintas culturas, oferecem hoje, as
demais mulheres e até para homens que
se interessem sobre o assunto,
experiências de conhecimento e
transformação. Tal qual nossas
ancestrais, nós, mulheres de novos
tempos, necessitamos estar
conscientemente vinculadas com a
energia de nosso lado obscuro para
descobrirmos o seu tesouro oculto, com
o qual poderemos transformar tanto
nossa vida pessoal como comunitária.

Texto
pesquisado e desenvolvido por
Rosane
Volpatto


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