LENDA DO
QUERO-QUERO


A Santa Família, na
sua fuga do Egito, preferia viajar à noite, para não ser vista pelos
soldados do rei Herodes, que andavam à sua procura, para matar menino
Jesus.
De dia, sempre que
podiam, os fugitivos entravam em alguma gruta da montanha e lá dentro,
livres do calor demasiado do sol, descansavam para que, ao anoitecer,
recomeçassem sua penosa jornada.

O burrico só
faltava falar. Parecia entender o perigo que a Sagrada Família estava
correndo. Não empacava, não ornejava, não fazia o menor ruído ao mudar
os passos. É que ele sabia, que sua grande missão era conduzir sua
divina carga ao salvamento.
Por outro lado, as
aves, mesmo as mais afoitas ao canto, mantinham-se em silêncio,
ocultas sob o dossel das ramagens. Suas vozes eram tão discretas, não
passavam que cochichos e isso mesmo bem abafados, pelo caridoso desejo
de não denunciar a presença dos fugitivos. Até os sapos eram como
pedras entre as pedras do caminho, as rãs então, eram como folhas
verdes entre as folhas verdes que boiavam nas águas mortas. Não era
ouvido o seu coaxo característico.
O quero-quero,
entretanto, alheio à todos esses acontecimentos, mais parecia um
bicho-carpinteiro e não cessava de gritar à altos brados com a sua voz
aguda:
- Quero!
Quero!......
Mas aquela não era
uma boa hora para "tanto querer" e Nossa Senhora e São José, repararam
em seu comportamento inoportuno. Ficava parecendo que o peralta da
campanha, tão barulhento, fazia o possível para que os soldados,
alertados, fossem especular o que estava passando àquela altura na
noite naqueles escuros e desertos caminhos...
Para castigo de ser
tão inconveniente, o quero-quero acabou ficando cantando daquela
maneira para sempre, alertando sem descanso o lugar onde é encontrado.

Dia 05 (cinco) de
outubro é comemorado o "Dia da Ave", esses pequenos anjos que são
símbolos dos estados superiores do ser e do pensamento.
Para algumas
culturas milenares, os pássaros já foram considerados fadas,
intermediários entre o mundo humano e divino, espíritos guerreiros
reencarnados e algumas vezes, podiam adquirir aspectos de uma Deusa,
como da escandinava Freya ou Rainha da ilha de Avalon Morgana, que
também se metamorfoseava-se em ave.
No Rio Grande do
Sul há um sentinela, um verdadeiro "cão-guardião" do nosso território,
que está sempre atento, marchando pelos pampas e que pode prever com
antecedência a presença de qualquer intruso: o QUERO-QUERO.
De tanto querer, o
quero-quero acabou sendo consagrado como a Ave-Símbolo do Estado
gaúcho pela Lei 7418 de 01/12/1980. Mas o pássaro, ainda não
satisfeito, continua querendo e, segundo a voz do povo, "querer é
poder", hoje é a mais cotada para tornar-se Símbolo Nacional.

A lição que fica da
Lenda do Quero-Quero é que deve-se ter muito cuidado com o "querer"
demais, pois para o olhar da cobiça, tudo pode ser possuído. A cobiça
é uma das forças mais poderosas no mundo ocidental atual. É triste ver
que as pessoas muito cobiçosas nunca possam desfrutar do que têm, pois
sempre almejam possuir mais. O motor e o plano da cobiça são sempre os
mesmos. A alegria é a posse, mas a posse é sempre descontente, tem uma
insaciável avidez interior. A cobiça é pungente, porque está sempre
obcecada e esvaziada pela possibilidade futura. Entretanto, o aspecto
mais sinistro da cobiça é a capacidade de sedar e extinguir o desejo.
Ela destrói a inocência natural do desejo, arrasa-lhe os horizontes e
substitui-os por uma possessividade compulsiva e atrofiada. É essa
cobiça que está atualmente envenenando os homens e a terra, pois o
"ter" tornou-se inimigo do "ser". A corrupção em que se encontra
envolvida a política nacional é um exemplo claro do que lhes digo.
As riquezas são com
razão odiadas por um homem guerreiro, pois um cofre cheio impede a
verdadeira glória.

Texto pesquisado e
desenvolvido por
ROSANE VOLPATTO
Bibliografia:
Mitos e Lendas do Rio
Grande do Sul - Antonio Augusto Fagundes
Estórias e Lendas do
Rio Grande do Sul - Barbosa Lessa; Gráfica EDIGRAF Ltda; SP

 

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