Conhecido e célebre é o
curare, veneno terrível com que os índios ao norte do rio Amazonas matam quase
instantaneamente; mas desconhecida e coberta com zeloso segredo era a
procedência dos elementos componentes do veneno.
Viajantes procuraram levantar, visitando
diversas tribos, o véu do segredo, naturalistas faziam experiências com
diversas plantas para assim descobrir a fabricação do mortífero produto.
A princípio, o mundo científico
considerava uma estrychnacea, que também cresce na Amazônia, como o principal
elemento que se fabricava o curare, até que o então diretor do Museu Nacional,
o Dr. J. B. Lacerda, por diversas experimentações provou que o curare era
fabricado de uma planta chamada Icú, (Anomospermum grandifolium Eichler), da
família das menispermaceas. (Arquivo do Museu Nacional, vol XI, Rio, 1901).
Entre os índios Guaicas, que habitavam às
margens do Orinoco, a fabricação do curare era rodeada de uma cerimônia
curiosa, que nos descreve o Dr. J. Bach e, ao que se sabe, as tribos do Alto
Amazonas e do Rio Negro, possuíam costume análogo.

O chefe da tribo era que realizava um
sorteio de três indígenas, que teriam que sujeitar-se à fabricação do temido e
enérgico veneno.
Eram sorteados dois homens e uma mulher
para este fim. Reuniam-se então, 186 elementos da tribo e principiavam a
fabricação do curare com as seguintes manipulações:
O morubixaba mandava preparar em uma
pequena clareira uma fogueira de fogo lento. Ao seu lado ele tinha duas
panelas de barro de tamanhos diferentes. A maior destas estava cheia de uma
tintura cor de chocolate claro, na quantidade de mais ou menos 800 gramas e a
menor a capacidade de 150 gramas. Poe sua ordem, a panela menor foi colocada
sobre a fogueira conservada em fogo lento e um dos índios sorteados esvaziou
ou verteu nela uma quantidade de tintura até o meio e introduzia no líquido
uma varinha resistente, com a qual o remexia. A evaporação era tão forte que
no espaço de duas horas e meia, o índio obtinha 800 gramas da tintura,
perfeitamente condensado. Ao término desta operação o indígena completamente
estonteado em conseqüência da forte evaporação do veneno, era substituído pelo
companheiro do sorteio. Uma hora e meia mais tarde, este último índio também
se via obrigado a abandonar a fogueira, também vítima de fortes tonteiras. É
revezado então pela mulher, que termina a operação, mas fica sujeita também
aos mesmos sintomas.

Durante esta função o chefe da tribo
formava com os outros indígenas que assistiam à fabricação, um semi-círculo
cuja a abertura era do lado para onde soprava o vento, de forma que os
espectadores não absorviam as evaporações do veneno.
Afirmou o mesmo naturalista, que os índios
se negaram de revelar-lhe se segredo. Contou ainda, que teve a oportunidade
de observar os efeitos do curare, quando dois remadores de sua canoa forma
flechados, sendo que poucos minutos depois de feridos, deixaram de existir,
observando que não tinham sido acertados em lugares considerados mortais.

O curare era empregado, não só nas flechas
lançadas por arcos, como também, em setas desferidas por zarabatanas,
dependendo da tribo e destino a ser dado ao animal abatido com tais armas.
A primeira menção sobre estas flechas
envenenadas, surge na História do Brasil, pelo relato de visitantes
espanhóis, que singravam o rio Amazonas, muito antes dos portugueses, pois
depois de conquistarem o Império dos Incas, passaram a buscar novas terras,
à procura de mais riquezas.
As lendas a respeito de uma cidade repleta
de tesouros incalculáveis situada em plena selva amazônica, denominada Manoa,
fez com que Gonzalo Pizarro organizasse uma expedição para procurá-la.
Foi então contratado o tenente Francisco de Orellana para enfrentar a feroz resistência imposta pelos indígenas. Esses
espanhóis navegaram pelo Amazonas sem jamais terem encontrado a lendária
cidade. Entretanto, a partir de certo trecho do percurso, os viajantes
passaram a sofrer um grande pesadelo, pois, durante o dia, flechas se
abatiam sobre a embarcação, e os homens atingidos por esses primitivos
artefatos, morriam a cabo de minutos, apresentando o aspecto de um terrível
sofrimento, embora não emitissem um gemido, sequer. Era o curare, o veneno
implacável.
Extraído de ervas nativas da Amazônia,
preparado seguindo rituais e técnicas centenárias que passam de pais para
filhos, o curare permanece ativo por séculos, sendo conhecido o caso de um
conservador de certo museu da Europa que se feriu numa ponta de flecha que
se encontrava no estabelecimento por mais de trezentos anos e teve morte
idêntica à dos exploradores flechados em plena selva. Realmente é
surpreendente!
Texto pesquisado e desenvolvido por
Rosane Volpatto