A GRALHA AZUL

A Gralha Azul (Cyanocorax caeruleus) é um
ícone do Paraná, semeadora do pinheiro paranaense (Araucária angustifolia), foi
declarada ave símbolo do Paraná pela Lei Estadual n. 7.957 21 de novembro de
1984:
Art. 1º. - É declarada ave-símbolo do Paraná
o passeriforme denominado Gralha-Azul, Cyanocorax caeruleus, cuja festa será
comemorada anualmente durante a semana do meio ambiente, quando a Secretaria da
Educação promoverá campanha elucidativa sobre a relevância daquela espécie
avícola no desenvolvimento florestal do Estado, bem como no seu equilíbrio
ecológico. Desde modo, a gralha azul como a árvore araucária, passaram a morar
não só na natureza, mas também no coração de todos os paranaenses.
A secretaria de Educação do Estado do
Paraná, publicou uma cartilha com 21 páginas em 1988, distribuída a todas as
escolas da rede municipal e estadual, na qual são divulgadas em nível popular,
um volume razoável de informações científicas sobre a gralha azul. Trata-se da
primeira iniciativa neste sentido em que são fornecidas informações sobre o
habitat natural, os deslocamentos na floresta, a alimentação, o sistema de
comunicação, a reprodução e a relação com a araucária. A Secretaria do Interior,
Agricultura, Planejamento, Saúde e Bem-Estar Social lutam em um esforço conjunto
pela defesa do meio ambiente propiciando assim, o direito à vida e proliferação
desta ave, principalmente no que se refere à araucária Araucaria augustifolia.
A Gralha Azul é encontrada nos estados de
São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, e também no Paraguai.
Medindo aproximadamente 40 cm, do bico à
cauda, de vôo lento e majestoso,a gralha azul, é uma das grandes aves
brasileiras. Ela vive em bandos geralmente de 4 a 9 indivíduos, evita cruzar
longos espaços abertos como o campo, por exemplo. As gralhas possuem um
comportamento de auxílio mútuo no qual umas limpam a plumagem das outras.

Conta uma lenda que "a gralha-azul é pássaro previdente. Em tempos de abundância
de pinhões enterra alguns deles para, na época de escassez de alimento, ter o
que comer. Acontece que costuma esquecer os lugares que usou para armazená-los
e, assim, nascem novos pinheiros. Por esse motivo não devemos matá-la ou
aprisioná-la, pois, ela é importante na recomposição das florestas destruídas".
Nos campos de vegetação rasteira formam-se galpões de pinheiros graças à Gralha
Azul, que gosta de enterrar os pinhões em lugares úmido. Ela é capaz de
"plantar" 3.000 pinheiros por hectare.
A Gralha Azul, antes mesmo de se tornar
ícone paranaense, já era consagrada e perpetuada pelo povo, como plantadora de
pinhões. Em conseqüência destas crenças no imaginário popular, inevitáveis
abstrações se fizeram presentes.
A primeira publicação de Lenda da Gralha
Azul, deve-se a Eurico Branco Ribeiro, que bem a representou em seu livro "A
Sombra dos Pinheirais", no ano de 1925. Também foi elemento divinamente
explorado pelas artistas plásticas: Clotilde Cravo
(pinturas no acervo do Museu Paranaense, em Curitiba) e Poty Lazzarotto (painel
exposto na Travessa Nestor de Castro em Curitiba), dentre vários outros.
Posteriormente o folclorista Luiz da Câmara Cascudo a eternizou em sua majestosa
lenda.
A LENDA DA GRALHA AZUL (versão de Luiz da
Câmara Cascudo)
Chegou à fazenda dos Pinheirinhos,
Fidêncio Silva, um grande homem de negócios, com casa matriz em Curitiba e
filial em Ponta Grossa. Veio em busca de repouso, necessitava urgentemente
afastar-se dos alvoroços dos negócios. Fidêncio era parente afastado da esposa
de José Fernandes.
Não tardou, para aquele homem desgastado
por inúmeros compromissos, sorvesse o ar puro e varrido da campanha guarapuavana.
José Fernandes tinha o recebido com muita
pompa, como merecia o ilustre visitante. Pôs os Pinheirinhos à disposição do seu
hóspede pelo tempo que desejasse. Não precisou falar duas vezes, lá
encontrava-se Fidêncio, com alma livre como passarinho, à sombra do pomar,
folheando um livro, ou não fazendo nada mesmo. Passeios não lhe faltavam, por
vezes ia ao rodeio, caminhava volteando o rincão..... Um dia passarinhava pelos
capões, noutro corria a vizinhança para trocar um dedo de prosa com os caboclos
e até pescaria, se quisesse, poderia fazer no picuiry, três léguas sertão
adentro. E, assim, transcorreram trinta dias agradabilíssimos, que Fidêncio
Silva tinha programado para passar nos Pinheirinhos.
E assim foi.
Num domingo depois do almoço, saiu a caça
com o fazendeiro. Municiados e com espingardas suspensas pelas bandoleiras ao
ombro, embrenharam-se os dois pelo extenso e tapado capão, "querência certa de
muito veado, cutia e quati", como afirmava José Fernandes.
Mas os caçadores não viam um animalzinho
sequer que merecesse chumbo grosso, até que em um momento, Fidêncio parou,
engatilhou, firmou pontaria, visando a fronde de retorcida guabirobeira. O
fazendeiro ergueu os olhos para olhar a caça e um súbito tremor lhe sacudiu o
corpo e, de um pincho, estava ao lado de Fidêncio. Mas já era tarde, pois o
rebôo do tiro já perdia-se pela mata, a evocar profunda tristeza na quietude
frouxa de um mormaço estonteante.
Mas...felizmente, o atirador havia errado o
alvo e o fazendeiro então, desafoga um suspiro de satisfação, dizendo:
-"Meus parabéns!"
-"Parabéns???", pergunta boquiaberto
Fidêncio Silva.
- "Aguarde-me, que lhe contarei tudo.
Sente-se aí nesse tronco e escute-me."
Foi quando então, José Fernandes, depois de
tirar um lenço para enxugar o suor que corria pelo rosto, também sentou
preguiçosamente sobre a trançada grama e foi falando:
-"Era inverno, há quinze anos atrás. Havia
muita seca e o gado caía de magro. Certa tarde montei a cavalo e saí a costear
banhados e percorrer sangas, na esperança de salvar alguma criação que
porventura se atolasse ao saciar a sede. Carregava comigo uma espingarda, pois
naquele tempo não poupava graxaim. Quando retornava, avistei um bando de gralhas
azuis descer à beira de um capão, entre numeroso grupo de pinheirinhos.
Aproximei-me vagarosamente e notei que elas revolviam o solo com o bico. Fiz
pontaria e aí, a espoleta estraçalhou-se e vários estilhaços vieram dar em meu
rosto. Tonteei e caí sobre a macega.
Quanto tempo fiquei desacordado não sei
dizer. Porém, antes de recuperar os sentidos, quando o Sol já procurava
encobrir-se por detrás do horizonte, algo mágico aconteceu. Revi-me de arma em
punho, pronto para fazer fogo. Foi neste momento que a gralha azul, com suas
asas brilhantes abertas, o peito a sangrar, veio se chegando a mim. Os pés
franzinos evitavam os sapés esparsos pelo chão e o andar esbelto tinha qualquer
coisa de divino. Permaneci estático e estarreci ao ouvir os sonoros e
compreensíveis sons que aquele delicado bico soltava naturalmente. Dizia ela:
- És um assassino! Tuas leis não te
proíbem de matar um homem? E qum faz mais do que um homem não vale pelo menos
tanto quanto ele? Pois sou eu a humilde avezinha, entoando a minha tagarelice
que faço elevar-se toda esse floresta de pinheiros; bordo a beira das matas com
o verdor dessas viçosas árvores de ereção perfeita; multiplico o madeiro
providencial que te serve de teto, que te dá o verde das invernadas, que te
engorda o porco, que te aquece o corpo, que te locomove dando o nó de pinho para
substituir o carvão-de-pedra nas vias férreas. E ignoras como opero! Venha até o
local onde interrompeste meu trabalho. Ali está a cova que eu fazia, para
depositar nela o pinhão sem cabeça com a extremidade mais fina para cima.
Tiro-lhe a cabeça porque ela apodrece ao contato da terra e arrasta à podridão o
fruto todo e planto-o de bico para cima a fim de favorecer o broto. Vá e não
sejas mais assassino. Esforça-te, antes, por compartilhar comigo nesta suava
labuta."
Levantei-me então a muito custo e fui até o
local escavado pelas aves, uma das quais jazia com o peito manchado de sangue,
ao lado de um pinhão sem cabeça. Pude compreender que certeza da visão. Mais
adiante, com as mão remexi na terra revolvida e descobri um pinhão com a ponta
para cima e sem cabeça.
José Fernandes, após uma pausa, concluiu:
- "Aí, está, caro Fidêncio,
como vim a ser um plantador de pinheiros. Quero valer mais que um homem: quero
valer uma gralha azul".
A GRALHA E SEU SIMBOLISMO UNIVERSAL....
A Gralha na Irlanda é codinome dado à
Deusa da Guerra. Ela aparece muitas vezes na forma de corvo, mas pode
metamorfosear-se em muitos animais. Deste modo, combate contra o herói
Cuchulainn, que havia repelido suas investidas.
A deusa celta Morrigan (Gália) e suas
irmãs, também aparecem na forma de gralhas e é desta forma que ela vem verificar
a morte de Cuchulainn.
A Gralha, em seu aspecto noturno de
corvo, era consagrada na Grécia à deusa Atena.
Na mitologia chinesa, a gralha é
associada à uma luz destrutiva, cujo poder deve ser domesticado, para tornar-se
benéfico.
Segundo a lenda, durante o reinado do
Imperador Yao, despontaram inesperadamente no céu dez Sóis. A terra sob a chuva
de raios tão quentes iniciou um processo de carbonização. Por todo parte a fauna
e a flora se extinguia e as rochas começavam a fundir-se. Os dez Sóis eram os
filhos de Di Jun, deus do Céu do Leste. Desesperado com tanta devastação, o
Imperador suplicou a Di Jun que persuadisse seus filhos a ouvirem a voz da
razão, a fim de que somente aparecem um de cada vez no céu. Di Jung conversou
com seus filhos, que não o ouviram. Diante disso, o deus, apesar da dor que lhe
causaria a decisão, ordenou ao arqueiro celeste, Yi, que descesse trazendo
consigo dez fechas brancas. Em terra Yi, atingiu os Sóis com suas flechas e eles
explodiram, um após o outro, em imenso abrasamento, caindo cada qual ao solo na
forma de gralha negra com o peito traspassado por uma flecha branca. Mas, como
deveria restar um sol no céu, para que a terra não mergulhasse na profunda
escuridão, o Imperador ordenou que um de seus cortesões roubasse uma das flechas
do carcás do arqueiro celeste. Assim, um dos filhos de Di Jun permaneceu intacto
no céu, difundindo seu calor e sua luz, indispensáveis à vida.
Na tradição de Ille-et-Vilaine,
antigamente a gralha possuía plumagem branca, a qual ela perdeu quando, enviada
por Noé para verificar se as águas do dilúvio haviam-se retirado, pôs-se a bicar
os cadáveres dos homens afogados.
No século XIV, a gralha passou por ser
modelo de fidelidade conjugal:
"Ela é tão casta coragem
E ama tanto seu macho
Que, se ele for surpreendido pela morte,
Para sempre permanece na viuvez".
Texto pesquisado e desenvolvido por
ROSANE VOLPATTO
Bibliografia consultada:
Gralha Azul, Bibliografia e Conservação.
Luiz dos Anjos. Editora "Companhia de Seguros Gralha-Azul", 1995, Curitiba-PR.
Lendas Brasileiras - Luiz da Câmara Cascudo.
Rio de Janeiro: Ediouro, 2000
O Simbolo Animal - Jean-Paul Rocnecker -
Editora Paulus
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