AS
AMAZONAS

Na Lenda Sagrada de Izi,
versão do rio Uaupés, segundo Barbosa Rodrigues, era punida com pena de
morte, toda a mulher que procurasse ver ou tocar os instrumentos de caça
ou usados nos festejos de sua sociedade secreta.
Ora, a curiosidade da
mulher é muito grande, e maior se torna quando a coisa é proibida, sendo
assim então, muitas mulheres caíram na alçada do prometido castigo. Com
o tempo, entretanto, elas ficaram fartas com tanta opressão, até porque,
além disso, os homens eram também maus e ingratos, além de tocarem a
elas o trabalho estafante da roça. Na guerra, eram as mulheres que
conduziam a carga pesada do armamento e no amor eram como inesgotável
abelheira, onde aqueles insaciáveis zangões vinham beber a embriagadora
volúpia. Resolveram numa reunião, que deveriam revoltarem-se contra tal
predomínio e tirania e abandonarem a terra, deixando como recordação
somente mechas de seus cabelos longos e e oleosos, que cortaram a golpes
de silex e os cadáveres dos pequenos filhos varões. Iriam para longe e
os homens jamais voltariam a vê-la.
Depois de muito andar,
saltar precipícios, atravessar rios, encontraram, por fim, um recanto do
éden, onde múltiplas orquídeas, abriram-se em risos para as estranhas
criaturas recém chegadas. Ali deveria ter sido, no começo do mundo, a
morada de Iaci, Mãe dos Lagos e Enfermeira dos Corações Doentes. E na Iaci-Taperê (Serra da Lua) se instalaram e construíram seu reino. Mais
abaixo havia um belo lago, onde a Lua vaidosa, se olhava docemente.
Deram-lhe o nome de Iaci-Uaru (espelho da Lua).
Os homens ao retornarem,
refazendo-se da surpresa, mas atordoados com o desapontamento, logo
saíram a procura das fugitivas, que vieram a encontrar e os receberam
hostilmente. Nada mais conseguiram os homens, então, com seu
arrependimento tardio, do que um encontro anual para desatar o fogo dos
seus instintos amorosos.

Antes das tais festas do
Amor, havia a jornada expiatória ao lago do Espelho da Lua, tão belo
quanto misterioso e oculto da profanação dos homens. Reunidas em torno
do Lago Sagrado, as Icamiabas, nas noites certas fases lunares,
provavelmente na Lua Cheia ou Quarto Crescente celebravam a festa do Iaci, a Lua, a mão querida e temerosa das filhas selvagens e à "Mãe do Muiraquitã", que habitava o fundo da referida lagoa. Subiam então, aos
céus, no meio da imensidade do sertão amazônico, através dos cantos, que
nenhum o de homem pode ouvir, nem jamais ouvirá.
O óleo balsâmico do umiri
e fina essência do molongó alcançavam os ares como uma oblação aromal à
deusa das noites serenas, que tece cuidadosamente com seus raios de
prata os filtros misteriosos os invisíveis amores e as germinações.
Maceradas de longas
vigílias e de flagelações, as filhas de Iaci, caíam em êxtase antes de
obter a purificação suprema das águas cristalinas do Espelho da Lua, em
cujo fundo se visualizava as pedras verdes.
Quando, as horas mortas,
a face da lua refletia bem clara na superfície polida do seu líquido
Espelho, então as amazonas mergulhavam na águas e recebiam das mãos da
Mãe dos Muiraquitãs as pedras verdes, como penhor da sua consagração, o
presente dessas jóias sagradas. Antes de expostas ao ar e à luz do sol,
dos quais recebiam a sua dureza e consistência, eram os muiraquitàs como
barro e assim tomavam do capricho das amazonas que afeiçoavam à sua
guisa, as mais bizarras formas: qual de uma flor, uma rã ou ainda a
cabeça de uma fera.
O celebrado Francisco
Orellana, primeiro descobridor do Amazonas, relata, que nas cabeceiras
do rio Jamundá habitavam estas guerreiras e era de onde retiravam as
pedras verdes em diversos feitios, de que se infere com grande evidência
ser algum barro ou semelhante, que dentro da água, como o coral, se
conserva mole e, com estas características é fácil moldar qualquer
figura com elas, mas depois de retiradas da água, ficam tão duras quanto
o diamante, não cedendo inclusive ao ferro.
O Muiraquitã é um dos
mais curiosos documentos etnográficos do Amazonas. Mostrando-se uma
pedra destas a um lapidário, foi classificada como nefrite ou jade,
apresentando variadas formas (triedro, poliedro), com linhas
acinzentadas. Os índios costumavam trazê-la pendurada ao pescoço como
amuleto ao emprestam grandes poderes e misteriosa significação. Durante
muitos anos acreditava-se que sua origem era externa por não haver sido
encontrada nefrite desta qualidade na América do Sul ou do Norte.

Existe uma pedra destas
que representava a cabeça de um cavalo e está expostas no célebre museu
do Sumo Pontífice Benedito XIV, em Bolonha. Entretanto, acho que este muriaquitã seja uma representação moderna, pois os cavalos só poderiam
ter sido vistos a partir de 1600 e devido ao impacto de tal visão foi o
suficiente para que um deles fosse gravado em uma peça sagrada. Para os
nossos índios, como os astecas os cavalos foram inicialmente
identificados como deuses ou demônios, até descobrirem que os mesmos
também morriam. Mas, o cavalo foge ao cenário amazônico e deveria estar
ausente na constelação dos muriquitãs tradicionais.
Em 1946, o arqueólogo
João Barbosa de Faria, em busca de sítios arqueológicos na área de Trombeta-Nhamundá, recolheu uma tradição corrente entre os moradores da
localidade de Faro, que poderia justificar a confecção de um muiraquitã
moderno, Segundo ele, os índios Uaboí continuaram por algum tempo a
fabricar os amuletos da pedra verde, na região Nhamundá, depois que as
Amazonas se retiraram para o norte.

A perfuração que permitia
que os índios pendurassem o Muiraquitã no pescoço, talvez fosse feita
com o auxílio de uma varinha de grelo de pavoca sorororca (Urania
Amazônica) e com areia fina e água. Foi encontrado também, pequenas
lascas e fragmentos de pedra verde, junto com cacos de cerâmica, muiraquitãs e outras peças, num sítio arqueológico visitada em 1880, nas
margens do rio Nhamundá. E, ainda, encontra-se exposto nos Museus de Bonn e Halles, na Alemanha, um grande bloco de nefrite de 5 a 6 quilos,
serrado em duas partes, recolhido em 1878, recolhido no "rio Topayos, no
Brasil", segundo informava a etiqueta destes museus.
Maurício de Heriarte,
Ouvidor Mór do Governador D. Pedro de Melo, da Capitânia do Pará afirma:
"até esta província, chegam navios de alto bordo e por este rio dos
Tapajós vão quatro jornadas a resgatar madeira, redes, orucús e pedras
verdes, que os índios chamam baraquitãs e que o estrangeiro do norte
estima muito. Comumente se diz que estas se lavram, a este rio Tapajós,
de um barro verde, que se cria debaixo da água e é debaixo dela que se
fazem certas contas compridas e redondas, vasos para beber, pássaros,
rãs e outras figuras e, tirando-o feito debaixo da água, ao endurece de
tal forma o tal barro que fica convertido em duríssima pedra verde".
Esta seja a explicação mais plausível para a origem do bloco de jade que
foi parar nos museus dos alemães.
O sentido original dos
muiraquitãs ficou perdido por volta de 1800.
O estudo sobre as
Amazonas nos dão um vestígio do matriarcado que existiu entre os índios
desta terra. A existência destas mulheres guerreiras exercendo seu poder
sobre os homens é conhecida nas tradições da América, além de apontadas
para o Brasil, por relatos incaicos e, no Velho Mundo, por lendas
greco-romanas. Estas tradições que busco resgatar em meus estudos,
demonstram como Morgan e Engels, tinham razão em defender que o fenômeno
do matriarcado era universal.
Um maior conhecimento
sobre as Amazonas se faz importante, não tão somente pelo fato de terem
existido, mas também porque nos levam a conceber todo o seu poder e
sabedoria que nós praticamente esquecemos de utilizá-lo, mas que pode
ser a qualquer momento ser reivindicados outra vez.
Quero deixar aqui
registrada a minha homenagem a todas as mulheres-índias guerreiras e
fortes que já existiram, assim como à aquelas que se encontram entre nós
e têm construído a nossa grandiosa e fascinante História.

AS
AMAZONAS HOJE

O arquétipo guerreiro das
Amazonas, está gravado na cultura moderna sob vários aspectos e é fonte
de inquietude e fascinação para os homens e inspiração para as mulheres.
Hollywodd e os produtores
de filmes para a TV, com seu sexto sentido para arquétipos emergentes,
foram recentemente atraídos pela poderosa e fascinante imagem da
Amazona, criando à sua semelhança, Xena, a Princesa Guerreira, que foi
um total sucesso. Nesta série, as mulheres também vivem, lutam e morrem
com grande paixão, defendendo com "unhas e dentes" sua nação.

Nós mulheres, há bem
pouco tempo renascemos através da emancipação, que nos permitiu o
domínio de nós mesmas. Hoje, nos lançamos em um mundo tradicionalmente
patriarcal, onde as profissões eram inicialmente restritas ao sexo
masculino. Mas, as mulheres-guerreiras da atualidade, são igualmente
capazes de exercer liderança criativa e de demonstrar capacidade de
decisão em todos os escalões da pirâmide de poder estabelecida
anteriormente somente para homens.
A Amazona contemporânea é
bem instruída e determinada e é acompanhada pelo bom senso e pela ordem.
Tais virtudes são forças poderosas e esta mulher com certeza, será
considerada em qualquer setor que escolher ingressar.

TERRA
BRASIL
"Agarrado ao teu corpo
Sinto que estou amarrado
Nas tuas tranças lúbricas de
Sol.
Sinto que estou crucificado
Pelos cipós em flor que
crescem em torno de nós.
Beijo-te a boca e encontro
nela
O sabor tropical de um fruto
úmido doce
O teu cheiro me instiga a
volúpia do olfato.
Os teus olhos azuis,
São mais azuis que todas as trapoeiradas
Que nascem dentro do mato."
Cassiano Ricardo.
Texto pesquisado e desenvolvido
por
Rosane Volpatto
