A
LENDA BRASIL, UMA OUTRA HISTÓRIA...
Por
mais que um estudioso terebre o passado com a verruma das pesquisas, o mistério
ainda esconde algumas verdades.
SÃO
BRANDÃO E A BUSCA DO PARAÍSO
Há
uma lenda que direciona a descoberta do Brasil aos monges viajantes da Irlanda
Medieval, mais precisamente à São Brandão.
Mas
vamos saber um pouco mais desta história?
São
Brandão, o Navegador, nasceu no último quarto do século V, próximo ou em
Tralee, em Kerry na Irlanda. Ele foi batizado e educado pelo bispo Erc de Kerry,
tornou-se um famoso abade, e morreu na década de 70 do século VI em Annaghdown
(Eunachdunne), Condado de Galway. Ele foi enterrado em Clonfert, Condado de
Galway. Ele é visto como um dos mais importantes santos da Ordem Irlandesa.
Como
a casa de São Brandão estava situada na costa oeste da Irlanda, é muito
natural que o mar tenha tido um papel importante na sua vida, como é, mesmo
atualmente, no folclore e na literatura da região. De fato, é através de suas
viagens marítimas que São Brandão tornou-se famoso na história e na
literatura como "Brandão, o Navegador".
Através
do tempo, a história de sua vida e de suas explorações foi dotada com proezas
e aventuras.
O
relato histórico apresentado em Navigatio, contêm uma história
interessante. A Navigatio apresenta um único
trabalho composto de elementos de várias origens. No seu âmago é um trabalho
de caráter visionário. O objetivo da viagem, descrita nesta história, e
realizada por São Brandão, é claramente a busca pela "Terra
Prometida". Essa procura por um Outro-mundo (Otherworld), uma
Terra-sem-males e alegre, é sem dúvida tão antiga quanto a própria
humanidade.
Além
da feição visionária existe outra característica religiosa identificada na Navigatio:
o ascetismo. No período entre a introdução do Cristianismo e a Alta Idade Média,
o clero irlandês demonstrou uma tendência extremada ao ascetismo. Rivalizando
na renúncia a toda a vida mundana, muitos monges irlandeses se retiravam
para o seu próprio deserto aquático: o oceano. Lá, nas grutas de ilhas solitárias,
separados de casa e dos amigos, eles poderiam viver suas vidas de mortificações
como solitários ermitões, em solidão e rezas. Outros, combinando ascetismo
com zelo missionário, poderiam abrir mão da segurança de sua ilha nativa e ir
para o Continente como missionários e pregadores. Pois foi vagando pelo Oceano,
por seis anos seguidos, que o "Ulisses Missionário", São Brandão,
assaltado por uma incrível distração, teria sido o primeiro a ter vindo parar
em uma ilha que foi chamada de Brasil.
A
história da navegação de São Brandão é a da busca do Paraíso Prometido.
Sua perambulação de um local para o outro, através de um mar banhado
pelos Sóis do Além, foi uma navegação povoada por anjos, pássaros, monstros
e demônios, sempre à procura da "Ilha Prometida", ou seja, do Paraíso
Perdido. Segundo a lenda, tal ilha, teria sido descoberta e colonizada por
São Brandão, este monge irlandês que partiu da Irlanda para o alto-mar no ano
de 565 e que a denominou de "Hy Brazil". O nome Hy Brazil,
significaria, "Terra Abençoada ou Afortunada".
Portanto,
sabemos agora que a Ilha do Brasil, ou Ilha de São Brandão, ou ainda Brasil de
São Brandão, era uma das inúmeras ilhas que já povoava a imaginação e a
cartografia européias, muito antes de aqui colocarem os pés, os portugueses e
espanhóis. Quando estes últimos aqui chegaram, já tinham conhecimento da
terra exótica e cheia de encantos que encontrariam. Não era à toa a
predisposição de maravilharem-se com tudo, pois sua imaginação já vinha
povoada de fantasias descritas pelos homens medievais. Até para Francisco
Orellana o encontro com as Amazonas não foi surpresa, pois elas já faziam
parte da mitologia heróica da Antiguidade Clássica, onde andavam às voltas
com Hércules e na Guerra de Tróia, ao combater os gregos, foram perseguidas e
derrotadas indo então, refugiar-se no interior da Ásia Menor. Quando estes
conquistadores depararam-se com os Curiguerês, colossos humanos de quase três
metros de altura, apresentando cor avermelhada, (queimados do sol) nada mais
normal de denominá-los de "Hércules Tropicais". Até Colombo, quando
afirmou ter avistado sereias nas Antilhas não se surpreendeu. Todas estas estas
aparições mitológicas já eram por demais conhecidas e só foram
rememoradas....
Só
quem desencantou-se com o Brasil foram justamente os religiosos. Para eles a
nudez de nossos índios foi encarada como "safadeza". Este povo
bronzeado do Sol, com suas "imprudências à mostra", sempre a sorrir,
"cevando as queixadas bestiais em corpos humanos", como disse
Anchieta, despertou a ira dos jesuítas, pois só vislumbravam neles o
pecado.
Mas,
nosso indígena em seu estado de pureza desconhecia o pudor. A nudez lhes
conferia fortaleza física, pois recebiam deste modo, a ação dos raios
solares, absorvendo elementos essenciais à vida e saúde. Viviam nus, sem que o
estado de nudez lhes provocassem sentimentos impuros. A mística do nu se
incorporava outrossim, a um sentimento paradisíaco, a uma vida livre e natural,
sem preconceitos, nem recalques, do tipo "corpo são, mente sã"'.
Nossos índios eram sorridentes, nus e puros. É bom lembrar, que o pudor
depende do modo de vida de cada um, assim como o pecado. Em geral, os costumes
primitivos, como se verificava entre os nossos índios, eram simples e se
revestem de castidade, só a civilização os corrompem. Na sua nudez, o índio
transmitiu a perfeita perfeição da pureza de pensamentos e intenções, da
qual se afastará, gradualmente, na convivência com o branco.
ORIGEM
GAÉLICA DA PALAVRA "BRAZIL"
São
numerosas as formas que a palavra assume nas diversas fontes cartográficas:
Brasil, Bersil, Brazir, O'Brazil, O'Brassil, Breasil. Desde os tempos mais
remotos existiam lendas gaélicas que faziam referências à esta ilha que era
comparada às Ilhas Afortunadas encontradas na mitologia greco-romana.
A
relação entre a Irlanda e as ilhas míticas do Atlântico está bem patente no
mapa de Fra Mauro de 1459 onde está desenhada uma ilha de nome Brazil com a
inscrição: "Queste isole de Hibernia son dite fortunate", ou seja,
classificando-a como uma das "ilhas afortunadas".
Filólogos,
asseguravam que "brazil" em gaélico, derivava de "brés" ou
"afortunado", mas que também pode ser traduzido como
"encantador". Seja qualquer que seja seu significado, esta terra, era
descrita como um "Paraíso". Deste modo, a palavra "brazil"
já existia muito antes de sua descoberta em 1500 e não estava associada a
madeira pau-brasil aqui encontrada. Varnhagem e Luis Weckmann, "asseveram
que este nome já aparecia numa Carta Anônima em 1324 e que desde aquela data
até 1500, ela está assinalada em mais de 28 vezes nos mapas, portulanos e
outros registros cartográficos conhecidos."
OUTRAS
ORIGENS DA PALAVRA "BRAZIL"
Na
Alta Idade Média a palavra surge associada à madeira vermelha. Segundo
Humboldt a sua origem radicaria na palavra de origem árabe, com o mesmo
significado, "bakkam". Este geógrafo chamava a atenção para o francês
"braise", o português "braza" e "brazeiro", o
castelhano "brasero", o italiano "braciere", todas elas
palavras relacionadas com fogo.
A
primeira referência documental a esta palavra surge num tratado comercial de
1193 assinado entre o Duque de Ferrara, na Itália, e um seu vizinho, que incluí
"grana de Brasil" entre uma lista de diversos produtos como incenso,
indigo. A mesma frase se repete "grão de Brazil" em uma Carta do
mesmo país cinco anos mais tarde. A repetida menção em documentos de teor público
indica tratar-se de um artigo comercial vulgar no século XII.
Outras
referências a "Brazil" aparecem nas escalas dos portos de Barcelona e
de outras cidades marítimas no século XIII, compilados por Capmany (58). Em
1221 encontramos "carrega de Brasill", em 1243 "caxia de bresil"
e, em 1252, "cargua de brazil". Em 1312, na cidade de Dublin, surgem
as palavras: "de brasile venali" (59).
Admite-se
que a palavra se refira a um tipo específico de madeira, ou a madeira em geral.
Palavras como "carrega", "caxia", "cargua", indica
que se tratava de um produto que era colocado em caixas.
As
viagens de nossos ancestrais, nos fazem reconstruir pedaço à pedaço o
passado, além de excitar o nosso fértil imaginário.
Rememorar
o passado é torná-lo presente...é interlaçar culturas. Tais conhecimentos
podem dar um outro colorido à paisagem humana atual. Os sons dos passos de
outrora, podem tornar-se audíveis à ouvidos sensíveis. Com o sentido da
audição, ouvimos a Criação e os tambores de nossos índios, nos fazem estar
em harmonia com a pulsação da nossa Mãe Terra. Deste modo, o eco de um
passado remoto ressalta-se no mistério oculto do silêncio interrompido
fazendo-se linguagem universal. Leva-se um pouco de tempo para se separar as
vozes e se compreender o significado. Conceda-se a oportunidade do silêncio e
aprenda a desenvolver a audição a fim de ouvir, no fundo de seu íntimo, a voz
eterna do tempo..
Rosane Volpatto
http://www.terra.com.br/voltaire/500br/lenda_brasil.htm
Selmer,
Carl (editor). Introduction in Navigatio Sancti Brendan Abbatis: From early
latin manuscripts. Worcester: Four Courts Press. 1989. p.p.vii-ix. Tradução: Márcia
Siqueira de Carvalho.

