
BOTO, DON JUAN DO
AMAZONAS


A
água foi nos ofertada como presente pelos deuses e é símbolo de fertilidade,
proteção materna e dá continuidade a toda a vida. Desde os tempos da
mitologia grega ela é habitada ou transformada.
Na
mitologia amazônica encontramos o mito do "Boto Rosa" que possui a
qualidade de emergir das águas do Rio Amazonas à noite e adquirir forma
humana. De peixe, transforma-se em um rapaz cuja beleza, fala meiga e sedutora,
magnetismo do olhar atraem irresistivelmente todas as mulheres. Por isso, toda a
donzela era alertada por suas mães para tomarem cuidado com flertes que
recebiam de belos rapazes em bailes ou festas. Por detrás deles poderia estar a
figura do Boto, um conquistador de corações, que pode engravidá-las e
abandoná-las. Ele também, inseri-se na comunidade, perseguindo as moças,
surpreendendo-as na roça, nos banhos ou viagens pelos igarapés, onde quer que
estejam e acabam a maioria das vezes, por lhe atribuir o primeiro filho.
Seduzidas,
as mulheres mantém encontros furtivos com esta entidade, que ao amanhecer
retorna ao fundo dos rios, onde reside.
Algumas testemunhas afirmam que ele
sempre se apresenta muito bem vestido, usando um chapéu para ocultar um
orifício para respiração que originalmente o animal possui no alto da
cabeça.

Conta-se,
que certa ocasião, havia uma tapuia que vivia só em sua palhoça e que de
repente começou a emagrecer e entristecer sem aparentar moléstia alguma.
Desconfiados que fosse obra do Boto, os homens da tribo fizeram-lhe uma
emboscada.
À
noite viram chegar ao porto um branco que não era do lugar e dirigiu-se para a
choupana. Acompanharam-no e quando ele entrou, de mansinho abriram a palha
da parede e viram-no querer deitar-se na mesma rede da tapuia. Então, um tiro o
prostrou e arrastando-o para a barranca do rio, confirmaram suas suspeitas, tal
homem era realmente o Boto. A autoridade local não fez corpo de delito, pois
matar um boto não é crime previsto em lei.

Nas
noites de luar do Amazonas, afirmam alguns, que os lagos se iluminam e pode-se
ouvir as cantigas de festas e danças onde o Boto, ou também chamado de Uiar a, participa.
O Boto
é o Dom Juan da planície Amazônica. Seu prestígio, longe de diminuir com as
dissipações do tempo, ganha novos florões com os casos que todo dia lhe
aumentam o lendário e a fé do ofício. O papel que lhe atribuem não difere
muito das proezas que assinalaram a famosa personagem de "Tirso de
Molina". O asqueroso mamífero misciforme, com aqueles seus dois a três
metros de comprimento, com aquele focinho pontiagudo e encabelado, passa por ser
um herói mais atrevido, em matéria de amor, de que os tipos de Merimée.
O Boto
é hoje um animal em extinção e grande culpa disso é por que o homem lhe
conferiu poderes mágicos. Muitos pescadores os capturam para corta-lhes o
pênis com a finalidade de fazer um amuleto de "conquista varonil" ou
para combater a impotência sexual. Suas nadadeiras também são utilizadas na
fabricação de remédios. Seus olhos são usados como atrair as mulheres. Os
pajés costumavam realizar rituais para preparar os olhos do animal a ser
entregues e usados pelos necessitados.
A
crença neste mito está disseminada pela população ribeirinha do Rio
Amazonas. O Boto representa o "animus"das mulheres, que faz
inter-relação entre o consciente e o inconsciente. O inconsciente masculino é
feminino e regido pelo "anima". O "animus" é a figura
masculina arquetípica que reflete o princípio masculino nas mulheres. O Boto
é este "animus arquetípico" representando tanto o inconsciente
individual quanto o coletivo. Sua grande beleza e poder de sedução são
explicados, quando entendemos que ele não é um homem e sim a imagem que as
mulheres fazem do homem.

SIMBOLISMO

O
Boto é símbolo de sedução e energia vital.
Todos os animais
aquáticos simbolizam o psiquismo, esse mundo interior e tenebroso através do
qual se faz conexão com Deus ou com o Diabo.
De natureza ambígua estes seres se
ligam aos rios e oceanos, lugar de todas as fascinações e de todos os terrores,
imagem da mãe e da deusa-mãe primitiva em seu aspecto generoso e criador e, ao
mesmo tempo, terrível. Mares, rios, são lugares selvagens e inumanos, onde a
lógica nunca prevalece. É por isso que todos os mitos e divindades
marinhas conservarão sempre um caráter arcaico. Saindo dessa água enigmática, os
peixes tornam-se eco deste terror antepassado, que roça o desconhecido.
Texto pesquisado e
desenvolvido por
Rosane
Volpatto

 



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