Abrir os olhos, iluminar a
inteligência com todos estes esplendores e maravilhas e deixar a alma
enamorar-se, embevecer-se no encanto constante de surpreendentes revelações,
de tão sublimes mistérios a ofertarem-se generosamente. Nada no mundo a
igualar em riqueza e variedade de temas à mercê de todas as inclinações, a
seduzir todas as inspirações.
Este é o nosso Brasil!
Mas, para nós, não existe
nada de mais interessante, do que assistir ao desfile e exibição de um desses
atordoantes "Bois-Bumbás", tão curiosos e tão admiravelmente
descritos e estudados por vários escritores e etnólogos ilustres.
Os homem branco contou a
história...os negros deram o ritmo com seus tambores... e os índios,
residentes antigos da terra, trouxeram consigo a magia de sua dança. Como se
vê o Boi-Bumbá é uma mistura de culturas, que uniram-se para criar um dos
espetáculos mais belos desta terra.
As suas figuras predominantes
são, além do Boi, em que se destaca um caboclo rude e valente, que é
conhecido como "cabra-bom", que se ufana da distinção e a pleiteia
como honra, o Pai Francisco, a Mãe Catirina, o Vaqueiro, o Caçador, o médico
e o Pajé.

LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA
Mas são tão variados os
Bumba-meu-Boi ou Bois-Bumbás...Diferem tanto, segundo a região e o tempo...Mas
sempre tão curiosos que bem justificam os estudiosos os considerarem o bailado
mais notável do Brasil, "o folguedo brasileiro de maior significação
estética".
Deve-se-lhes a maior
animação das festivas noites no mês de junho na terra amazônica. No Rio de
Janeiro e no Mato Grosso do Sul, também é anunciado com alarde o Boi-Bumbá no
mês de junho. É conhecido como Bumba-de-Reis,
no Espírito Santo. Já no
nordeste , na região da jangada, ele está ligado às festas do Ciclo de Natal (no
período entre meados de novembro e o dia de reis)
e sua denominação varia: conhecido como boi-calemba na Paraíba e no Rio Grande
do Norte; Boi-de-Reis; no Ceará.
Os personagens do espetáculo são classificados em três
categorias: humanos (o Capitão, Mateus, Pastorinhas etc); animais (Burrinha,
Ema, Cavalo-Marinho, Boi); e fantásticos, entre estes o Diabo, o
Morto-Carregando-o-Vivo, Babau, etc.
Em algumas áreas também é chamado de Cavalo-marinho (Mata Norte de Pernambuco e
de algumas regiões da Paraíba). A dança do Cavalo-marinho é bastante animada e
seu ritmo é marcado por um sapateado que lembra o galope dos cavalos. São passos
rasteiros intercalados de saltos rápidos, para levantar poeira.
São 76 personagens ao todo, entre humanos, animais e fantásticos. As figuras
mais conhecidas são Mateus, Bastião, os galantes, as damas, o Capitão e o
Soldado. Entre os animais, destacam-se o Boi e o Cavalo.
A festa é coordenada pelo Capitão Marinho. Os amigos, Mateus e Bastião, dão
bexigadas em todos que entram na roda, divertindo o público.
Os galantes e as damas, formando pares, realizam um baile em honra aos Santos
Reis do Oriente, cantam loas e fazem a dança de São Gonçalo dos Arcos.
São apresentadas diversas situações, entre elas, momentos do Reisado e do
Bumba-meu-boi, terminando com a morte e ressurreição do Boi.
Em São Paulo é denominado de Boi de Jacá e Dança do Boi. O boi toma o nome de
jacá, porque prepara-se um jacá, coloca-se nessa armação a caveira de um boi.
Atualmente em Ubatuba há dois grupos de Dança de Boi que apresentam-se no
Carnaval.
Em Santa Catarina é
conhecido como boi-de-mamão e o Rio Grande do Sul como boizinho. A grande leva
de migrantes nordestinos foi que trouxeram tal prática para o Sul.
O Bumba-meu-boi é um folguedo
noturno.

TEMA
DO BOI
A composição
dramática é de grande simplicidade. O fundamental é a ressurreição do boi,
havendo pequenas variações dependendo da região em que é executado.
No Maranhão conta-se que, a Mãe Catirina, grávida desejosa, anseia por um saboroso prato regado a língua de
boi. Pai Francisco, preocupado em satisfazer a vontade da amada esposa, mata o
melhor animal de seu patrão e foge. O dono da fazenda, indignado e revoltado
com tal afronta, resolve fazer justiça e manda os vaqueiros e os índios
saírem a caça do fugitivo. Ao ser pego e preso, Pai Francisco pede socorro ao
pajé, que realiza um grande ritual ressuscitando o boi para a alegria de todos.
Outra variação: entra o boi que
investe como na tourada. Zangam-se e matam-no. O boi não devia morrer e é
preciso fazê-lo reviver. Chamam o médico e basta que este encoste no boi sua
espada de prata para que ele ressuscite.
O enredo deste festival
resgata uma história típica das relações socioeconômicas do período
colonial, marcado pela monocultura, a criação extensiva e a escravidão.
Tais festas não passavam de
brincadeiras sem maldade que foram vítimas de perseguições da polícia e das
elites, pois tratava-se de uma manifestação de alegria afro-popular e foi
então proibida nos anos de 1861 a 1868.

ACONTECEU EM MANAUS
Contava-se antigamente, que
havia partidos que proclamavam, cada qual, a excelência de habilidades do
Boi-Bumbá preferido. E os encontros eram ruidosos e contundentes. Isso, foi um
dos motivos que levou as autoridades a proibirem a sua saída, ficando
limitados, portanto, aos respectivos currais.
Os jornais do Manaus, no ano
de 1946 noticiaram um conflito pitoresco entre dois bois afamados e rivais, que
foi até certo ponto um pouco cômico. Relatava que sob as aclamações do povo
de um bairro, um Boi-bumbá deixava o seu curral para vir dançar em frente a
várias residências da cidade. À frente precedido dos tocheiros, vinham os
índios com seus elaborados trajes, os vaqueiros, o padre, o Pai Francisco, a
Mãe Catirina, o pajé, etc. A seguir, o boi com os chifres todo enfeitado de
fita, urrando. Logo atrás, marchava uma grande onda constituída dos fãs e
torcedores, composta por homens, mulheres e crianças, gente de todo o tipo,
disposta a acompanhar o boi em sua jornada até a cidade e seu regresso pela
madrugada ao curral.
Mais ou menos neste mesmo
horário, outro Boi-Bumbá deixa o curral, saindo também com todos os seus
representantes caracterizados, arrogantes, entoando as suas danças de guerra e
visitando várias casas da cidade.
Cada um tomou um rumo,
percorrendo trajetos diferentes, cantando aqui e acolá.... dançando ali...até
que, lá pelas duas horas da manhã os bois se encontraram!
Deu-se
o encontro em uma determinada rua, no momento que um dos bois estava realizando
o cerimonial da matança. O Pai Francisco acabava de dar o tiro de morte no boi
e o povo cantava animado:
"Chico
tira a língua
Chico
tira a língua
Chico
tira a língua
Se
quer tirar...."
E
o Pai Francisco respondia:
"A
faca está cega,
A
faca está cega,
A
faca está cega
Não
quer cortar..."
De
súbito o pessoal calou-se e começou a se agitar. O outro boi havia dobrado a
esquina. Mas em seguida, concentraram-se novamente na matança, entretanto, um
nervosismo acabou por dominar aquela gente, já prevendo as conseqüências do
tal encontro. Não deu outra, o povo do outro boi ao aproximar-se passou a
cantar estribilhos de provocação. Fechou o tempo e foi bordoada para tudo
quanto é lado. Encerrando o "causo", acabou todo mundo na delegacia.
Nesta
época, era costume o Boi-Bumbá saudar os donos da casa e as pessoas presentes
que dançavam a sua volta. O boi se requebrava em acrobacias fantásticas,
alucinantes, parecia incorporar um espírito de cabra. Tomava cachaça ou
qualquer outra bebida que lhe oferecessem e saía para uma nova visita e assim
ia pela noite adentro ao som das matracas, de toadas saudosas, de cavaquinhos e
rebecas, em grande alarido, dançando sem parar, sem a menor sombra de cansaço,
à luz de balões multicoloridos, sob o céu estrelado e pontilhado de mil bolas
reluzentes ao sabor da brisa.
Finalmente
acabava por volta ao curral, onde a multidão ansiosa se comprimia e se agitava. E,
num estrado decorado com festões verdes e grinaldas de cores berrantes,
seguia-se as danças, ao som das toadas nostálgicas, até que o boi morria e
era esquartejado e dividido entre os presentes. Dividido simbolicamente, é
claro, enquanto que barracas a sua volta vendiam bugigangas e guloseimas para
todos os gostos.

BUMBA-MEU-BOI
NO MARANHÃO

No Maranhão
(que recebeu logo ao início do séc. XVI a colonização de
lusitanos das Ilhas dos Açores), a
festa do boi atingiu um grau de riqueza cênica impressionante e está presente no
ciclo junino, onde se fixou principalmente entre os festejos que homenageiam São
João e São Pedro, podendo prolongar-se até agosto.
Ao findar os festejos natalinos, os grupos de bumba-boi
iniciam as reuniões, que vão até 31 de abril, quando preparam os enredos e
elaboram novas músicas e coreografias.. A partir de maio, começam os ensaios com
cada personagem elaborando a sua performance em conjunto ou separadamente. Tudo
isso é feito até 15 de junho. Contudo, o chamado ensaio-redondo, como se fosse a
apresentação definitiva, pode ocorrer até o dia 23 do mesmo mês. As vésperas de
São João, ocorre o batizado do boi, em cerimônia na igreja, com a participação
de padrinhos ou madrinhas Boi, o que bem demonstra o alto grau de sincretismo
entre o profano e o religioso e a importância sócio-cultural desse evento para o
povo do Maranhão. É quando também, todos
irão se deslumbrar com o novo couro do boi, verdadeira obra de arte composta de
vidrilhos, miçangas e desenhos inspirados no enredo escolhido para o ano.
Para o maranhense, o bumba-meu-boi representa a
tríplice miscigenação de seu povo, pelo entrelaçamento das culturas branca,
negra e indígena, verificada nos personagens presentes no auto, no qual se
destacam o dono da fazenda, Pai Francisco, Catirina, vaqueiros ou caboclos de
fitas, caboclo real ou de pena, índios, doutor ou pajé, padre, Dona Maria
(esposa do amo), os cazumbás (mascarados, espécie de palhaços) e o miolo,
responsável por guiar o boi. As variações dos personagens ocorrem também por
causa dos diferentes ritmos existentes no Maranhão. O que distingue esses
sotaques, como são chamadas as músicas tocadas nos bois maranhenses, são os
instrumentos musicais em destaque e a cadência do ritmo dada a cada tipo.
O boi-de-matraca apresenta entre seus instrumentos de
percussão as matracas, dois pedaços de madeira de som rústico que, batidos
freneticamente, produzem um barulho vibrante, juntamente com enormes pandeiros,
tambores-onça e maracás.
Outro estilo encontrado são os bois-de-zabumba, com
tambores que possuem mais ou menos meio metro de altura, feitos de compensado,
amparados por uma forquilha, que juntamente com pandeiros e maracás, produzem um
som característico e contagiante.
Já ps bois de orquestra são os mais recentes e diferem
completamente dos anteriores, utilizando um conjunto de instrumentos de sopro
(saxofones, flautas, clarinetes) e de percussão (bombo, tambor e maracás).
Atualmente o boi de Pindaré tem marcado um estilo como uma variante do
boi-de-matraca, pelo seu ritmo mais lento, com pandeiros menores e diferentes
trajes, ressaltando-se os imensos chapéus cujas abas da frente são dobradas ao
estilo dos cangaceiros.

Nos últimos tempos, a brincadeira ganhou motivos de
sátiras a acontecimentos políticos, sociais ou econômicos, apresentando de forma
humorística fatos relacionados ao Brasil. Nessa maravilhosa expressão da cultura
brasileira, repleta de histórias simplórias e de promessas, a brincadeira do
bumba-meu-boi no Maranhão é muito popular. Nela, toda a comunidade se entrega,
numa participação gratuita, apresentando uma festa feita pelo povo e para o
povo.
Ao bumba-meu-boi junta-se o batuque de outras
brincadeiras, como o tambor-de-crioula, o coco, o pela-porco. Tudo muito bonito
e muito alegre.

POSSÍVEIS ORIGENS
Renato
D'Almeida, nos seus vários ensaios sobre Bumba-meu-Boi, afirmava ser esta uma
diversão caracteristicamente brasílica com os três sentidos que informa o
Brasileiro, refere-se, todavia, as reminiscências européias, seja o Boeuf-gras francês
(restabelecido por Bonaparte), que
no século XVII, percorria as ruas de Paris, coroado de flores num cortejo
movimentado que parava às portas mais importantes para homenagear os donos da
casa, seja o "Monólogo do Vaqueiro", do Mestre Gil, que a 8 de junho
de 1502, foi representado nos paços do Castelo de D. Maria, para festejar o
nascimento do príncipe D. João; seja as "Tourinhas
Minhotas", ou ainda os "Touros de Canastra" portugueses, para
acentuar que "seria muito difícil estabelecer definitivamente a verdadeira origem
desta festa popular". "Pode ser que entrasse ali, esclarece, o
elemento português, com uma ligeira reminiscência dos velhos autos e das
velhas chácaras, em que a figura do vaqueiro foi muitas vezes explorada e o
elemento africano, com seus decantes bárbaros, a que não falta, entretanto,
uma admirável intuição musical."
Estas
reminiscências são por certo fatos evidentes. Principalmente em certos
Bumbas-meu-Boi de algumas regiões do Brasil.
"Também
de Portugal nos veio à origem primitiva da dança-dramática mais nacional, o
Bumba-meu-boi" afirma Mário Andrade na sua "Pequena História da
Música" e acentua: "as fadigas do pastoreio se transformam em arte,
celebrando ritualmente a morte e a ressurreição do boi".
O
célebre etnógrafo brasileiro Artur Ramos via na morte e divisão do boi pelos
presentes de circunstância uma incontestável afirmação totêmica: "Um
repasto totêmico que todos participam":
"Um
pé com uma mão
é
para seu capitão.
A
tripa fininha
É
para minha rainha.
O
quarto dianteiro
É
para o seu Monteiro."
E
assim sucessivamente, parte por parte, do boi sacrificado. Insiste ainda em que
é no "Bumba-meu-Boi", que os complexos totêmicos se mostram com mais
evidência.

AMAZONAS,
PALCO DA ÓPERA DO BOI-BUMBÁ

O
Amazonas devora o fraco e exalta o forte. É uma prova de resistência, uma
forja que destrói valores falsos e retempera os verdadeiros.
É
embrenhando-se nesta maravilhosa selva do folclore amazônico que
compreenderemos este sentimento verde-amarelo, nascido da inquietude e bravura
de nossos ancestrais, com traços saudosos brancos, adicionados aos fortes
vínculos da alma assombrada do negro e a altivez e arrogância de nosso bravo
índio guerreiro, deferindo flechas contra o invasor.
"No
esplendor do Amazonas os mitos vicejam, robustos, inconcebíveis, mas ainda com
seiva quente das terras de origem".
Num
arquipélago, mergulhado de encantos, chamado de Tupinambarana, encontramos
Parintins, o coração pulsante da selva amazônica, onde anualmente, por três
dias, se estende um palco de pura magia e sedução: o Festival Folclórico do
Boi-bumbá.
Cidade
bi-partida, mas não tem nada a ver com almas-gêmeas não, bem pelo contrário,
há disputa de beleza. Uma área é domínio do Boi Garantido, um boi branco,
que é majestade a partir do belo porto até a Catedral da padroeira Nossa
Senhora do Carmo. Lá só se vê bandeiras vermelho sangue, tão quentes quanto
as vontades de seus fervorosos fãs. Do outro lado, a cidade se veste de azul e
o céu é seu limite, reino do não menos majestoso Boi Caprichoso, tão negro
quanto uma graúna. Entretanto, muito embora a rivalidade impere, ela é
organizada, respeitosa e saudável.
Parantins, sempre duas, algumas vezes várias, é
uma cidade que decidiu construir seu futuro com a força de sua alegria, com a
dança de seus dois boizinhos, com o vigor de suas tradições.

MAS
QUE FESTA "PORRETA" É ESSA?

É
sem dúvida a celebração da vida e dos costumes nacionais, um carnaval à moda
da casa, sobressaindo-se a altivez dos antigos donos da terra. Nesta festa de
tanto alumbramento visualiza-se a energia de todos os braços, a audácia de
todos os empreendimentos, o prodígio de todas as inteligências e o milagre de
todas as vontades, onde abraçam-se a tradição com a modernidade. Sua
estética não fica devendo nada para as escolas de samba do Rio de Janeiro,
mesmo não tendo nada a ver com tal famoso evento. Este festival reflete um
compromisso audacioso de resgate com o universo indígena e o caboclo
amazônico, este é o motivo de não haver termos de comparação.
As
estrelas mais reluzentes são, os Bois e as pessoas simples nascidas das
entranhas do lugar, que através de pensamentos únicos e originais, com pleno
conhecimento da engenharia das peças, criam alegorias fantásticas.
O
grandioso evento toma corpo e alma em um bumdóbromo, um estádio construído
para este fim, inaugurado em 1987, possuindo a capacidade de abrigar 40 mil
pessoas.
O
espetáculo do Bumba-meu-Boi hoje, casou brilhantemente o homem simples às
técnicas modernas, criando uma performance mágica, passando muita emoção com
o canto e a dança, marcada pela garra de um boi que é rei.
Diferente
dos outros folguedos do resto do país, na ilha de Parintins, a festa do
Boi-bumbá concretiza a exaltação do mundo tribal, trazendo à tona rituais,
mitos e lendas em consonância com a magnitude do folclore, que são encarnados
na arena por ícones da cidade.
Garantido
e Caprichoso, nasceram na segunda década do século XX, mas a criação do
festival deu-se em 1960, iniciativa da Juventude Católica de Parintins para
revitalizar os folguedos folclóricos.
A
cultura do boi medieval coberto de pano e enfeitado com fitas, foi trazido para
a ilha por migrantes nordestinos durante o Ciclo da Borracha. Eram outros
tempos...época dos coronéis.... que detinham todo poder e riqueza da região.
Para brincar e louvar o boi, nossos ancestrais tiveram que enfrentar o poderio e
a fúria destes senhores feudais.
O
fundador de Garantido, mestre Lindolfo Monteverde, nasceu em 1895. Sendo
descendente de negros, enfrentou discriminação racial fortíssima e foi
através de folhetos trazidos por imigrantes e muito esforço próprio, que
aprendeu a ler e escrever. Mas possuía veia poética e em 1912, o jovem,
reunindo-se com outros companheiros idealistas, avança em sua escalada de
iniciação folclórica, enquanto trabalha duro nos seringais. Contrai malária
e religioso como ele só, faz uma promessa de vida à São José: colocaria
todos os anos que se seguissem, um boi na rua para homenageá-lo. Conclui
sacramentando:
-"...eu
lhe Garanto"
E,
no ano seguinte, no dia 24 de junho de 1913, o "Boi Garantido"
apresenta-se como o prometido.
No
ano de 1915, a brincadeira foi vista com "olhos grossos", pela
polícia, mandatários dos coronéis, e Lindolfo foi chamado a prestar
declarações na delegacia. Depois de um "chá" de explicações, não
convencido e bem mandado, o delegado fichou o "Boi Garantido" como
perturbador da ordem ordem pública. Mas a fá fama, acabou em estrelato, para
conforto e alegria do povo.
O
amor de Lindolfo por seu boi, coube de herança aos seus filhos que seguiram com
a tradição que transformou-se na Nação Vermelha e Branca no terreiro da
Baixa de São José. Com sua voz forte, ele cantava assim:
"Se eu pudesse Garantido
Não te enterrava no chão
Mandava abrir tua cova
Dentro do meu coração".
O
Boi Caprichoso nasceu do mesmo jeito, de uma promessa dos irmãos Cid, vindos de
Crato, Ceará. É um Boi nascido de um desejo de trabalho, de uma promessa aos
céus. O Caprichosos, ao longo de sua história, sempre foi encarado como
brincadeira séria, como uma história bonita. Sua ascensão ocorreu paulatinamente
e explodiu em forma de espetáculo suntuoso, deslumbrante, ganhando dimensão e
difusão.
Diferente do Boi Garantido, que é branco, este é preto, que lhe
rendeu o apelido de "Diamante Negro".
Estes
dois Bois muito contribuíram para o despertar e o fortalecimento da nossa
cultura. O povo de Parintins começou a ganhar identidade cultural no momento que
passou a assimilar a cultura amazonense e inseri-la no contexto da brincadeira
que vem paulatinamente sobrepujando sua tradição.
Hoje, a grande força dos Bumbás são os rituais
onde se destaca a cultura indígena.
Os caboclos parintinenses são os protagonistas
dessa festa e vivem-na intensamente na realidade da terra e dos ares.
O índio é o personagem que mais sobressai no
Boi e foi no pensar e repensar indígena que abrimos as portas a nossa cultura
que, a cada ano, se renova graças à dinâmica dos responsáveis pela construção do
Boi.

CONSIDERAÇÕES
GERAIS

O
Boi foi um animal que deixou profundas marcas no processo civilizatório e de
expansão do país. Ele esteve ligado à agricultura e à aração. Ele é
símbolo de bondade, de calma e força tranqüila que carrega o fardo da
honestidade e do trabalho resignado, portanto deve ser estimado com respeito e
têm direito a tratamento especial.
"A
figura do boi marca a força e poder, o poder de rasgar sulcos intelectuais para
receber as chuvas fecundas do céu, ao passo que seus chifres simbolizam a
força conservadora e invencível".
O
boi era considerado animal sagrado no Grécia Antiga. O deus Sol também tinha
seus bois, de brancura imaculada e providos de chifres dourado. É, sem dúvida,
por este caráter sagrado e por suas relações com os ritos religiosos que o
boi era também considerado símbolo do sacerdote.
Animal útil, que nas festas pagãs dos cultos de
Dionísio, entrou pela tradição ao figurar na iconografia católica romana,
simbolizando o evangelista São Lucas. O boi em muitas catedrais ou igrejas
católicas aparece nas pinturas do teto, num dos quatro cantos além do leão, da
águia e do homem ou anjo. Também figura na cena bucólica da manjedoura de Belém,
anualmente rememorado nos presépios armados para as festas natalinas. É ainda,
considerado irmão gêmeo do escravo no trabalho.
Dos elementos formadores de nossa etnia, somente o
nosso indígena o desconhecia, porque o africano e o europeu tinham-no em sua
cultura milenar de onde provieram. Foi fácil aproveitar a figura do boi para
ensinar a tese da ressurreição para os índios, negros, portugueses e mestiços.
Sim, mestiços, no bumba-meu-boi domina a presença do mestiço, pois todos possuem
seu papel nesse bailado: o branco é o dono do boi, o mulato é negro que vai
roubá-lo da fazenda, o índio é representado pelo pajé e o doutor ou médico é que
fará ressuscitar o animal.
O bumba-meu-boi brasileiro não tem boi de verdade, é um
boi de armação recoberto de panos ou revestido de materiais mais modernos, que
oculta um homem por debaixo dele.