 
A Lenda do "Fogo
Morto" já foi
muito popular no
Rio Grande do
Sul. Mas, ainda
hoje os que
ainda, se
aventuram em
carroças cruzando
os pampas
gaúchos,
continuam a
observar esta
velha tradição:
jamais acender um
novo fogo sobre
as cinzas ou
restos de um fogo
alheio. Porque?
Foi Roque Calege
que recolheu esta
lenda em sua obra
"Fogão do
Gaúcho", e nos
conta a razão
para tamanha
superstição:

"Por várias vezes
notei em
contínuas e
estafantes
viagens pelos
recantos mais
afastados do Rio
Grande um fato
que pela sua
estranha
singularidade me
preocupara
vivamente a
atenção:
carreteiros e
maiorais de
diligência,
tomados de um
terror
supersticioso
evitavam, sempre,
fazer o seu fogo
no mesmo lugar
que tivessem
sinais de um
fogão anterior.
De sorte que à
beira dos capões
e restinga,
sítios
apropriados e
preferidos pelos
viandantes da
campanha para a
sesta e pousos
depois de longas
marchas por
estradas
acidentadas, era
comum
encontrarem-se um
sem número de
fogões extintos,
sem que um só,
jamais fosse
feito no lugar
que tivesse
vestígio de
outro.
Tomado de natural
curiosidade,
inquiri, de uma
feita, sobre o
caso ao peão que
me conduzia à
caminho de
Soledade,
justamente na
ocasião que ele
iniciava o fogo
para o chimarrão
apetecido.
- Qual o motivo,
amigo, desse
esquisito
escrúpulo?...
A minha pergunta,
o gaúcho
encarou-me com
escarninho
sorriso.
-Ué gente!...
Então o
patrãozinho não
sabe? Chama-se a
história do "Fogo
Morto", muito
conhecida por
este e outros
pagos...
Acocorado,
depois, na relva,
sob a ramagem de
salso, contou-me
então, a lenda
que dou aqui, em
desfigurado
resumo, um
apanhado fiel,
respeitando a
tocante singeleza
de seu entrecho e
a rústica
simplicidade de
seu estilo.
E o gaúcho
começou:
Pois foi uma vez,
há muito tempo,
lá pras bandas da
fronteira, em
caminho de
Alegrete para
Quaraí. Um
carreteiro rico,
muito rico, que
tinha de seu,
além de campo e
dinheiro, mais de
cem juntas de
bois invernados,
foi fazer uma
viagem longe,
muito longe do
rincão da
querência.
Depois de ter
andado quase o
dia todo,
resolveu, à
tardinha, já
mesmo no momento
que o sol
entrava, fazer
pouso no costado
de uma restinga,
perto da estrada
geral.
Tocou até lá a
carreta e, com
auxílio do
peãozinho que
levava, desajojou
os bois,
soltando-os para
o campo. Em
seguida, mandou
trazer lenha do
mato, para
preparar o fogo,
a fim de assar o
churrasco e
requentar a
panela de feijão
com charque. Ao
lado, quase junto
da carreta,
encontrou
vestígios do
fogão de algum
carreteiro que
ali pousara ou
sesteara na
véspera. Com
isso, se livrou o
homem, do
trabalho mais
longo. Aproveitou
a lenha e os
gravetos, que se
conservavam
acesos, entre a
cinza e, no mesmo
lugar, em cima do
outro fogo,
iniciou o seu,
que logo vingou
em grossas
labaredas, ao
lado da carreta.
- Mas para que se
meteu o
carreteiro em
aproveitar o
alheio?
A desgraça
começou naquela
hora!...
- As labaredas
cresceram em
línguas de fogo:
as línguas de
fogo começaram a
lamber a carreta;
a carreta ardia
em chamas; as
chamas subiam
cada vez mais,
devorando tudo. O
peãozinho e o
carreteiro
corriam que nem
veado, para o
arroio, trazendo
água e atirando
no fogo. Mas este
crescia mais
violento ainda,
sem que toda a
água do arroio
desse para
apagá-lo. Só
quando o arroio
secou foi que o
fogo também se
extinguiu, depois
de ter reduzido
sua presa a um
grande monte de
cinzas. O rico
carreteiro saiu
como louco, campo
fora. A desgraça,
porém, não parou
nisso: desde esse
dia malfadado, os
bois começaram a
pestear e a
morrer; o
dinheiro
desapareceu da
casa, roubado; a
mulher sumiu-se
sem que até hoje
saiba novas de
seu paradeiro. E
o homem, que fora
rico, muito rico,
morreu pobre,
muito pobre,
perseguido à hora
da agonia por
apavorantes
visões
transformadas em
línguas de fogo,
lambendo-lhe o
corpo todo.
Dizem os antigos
que desde desse
dia, então, todos
os carreteiro que
tiveram notícia
do triste fato
acontecido, nunca
mais fizeram fogo
no lugar em que
foi fogão de
outro..."

Texto pesquisado
e desenvolvido
por
Rosane Volpatto
Bibliografia:
Lendas do Rio
Grande do Sul -
Dante Laytano;
Publicação n´7 -
Comissão
Estadual do
Folclore do Rio
Grande do Sul;
RJ; 1956


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