O
REINO DOS MORTOS
MICTLÁN
Para
entendermos sobre Mictlán (Lugar dos
Mortos) e de Mictlantecutli e
Mictlancihuatl (Senhor e Senhora da
Morte), temos que nos desprender das
concepções ocidentais da morte.
Para
nossos distantes ancestrais a relação
da vida era unida à da morte. Segundo
esta concepção, não se têm consciência
plena da vida, se não tivermos consciência
plena da morte. Desta forma o Quinto
Sol (em que vivemos), foi produto do
sacrifício e morte de Telauciztécatl
e Nanahuatzin, deuses que se jogaram
ao fogo cósmico que ardia em
Teotihuacán, para a partir de sua
morte, converterem-se em Lua e Sol.
Morrer
para renascer. Este ensinamento nos é
propiciado pelo Sol, que nasce,
incansavelmente no Oriente (oeste) e
se extingue, moribundo, no útero
devorador do mundo no Ocidente
(leste). Da mesma forma que a
natureza, o homem está condenado a
morte eterna. Morte e vida são
portanto, aspectos de uma mesma
realidade. A vida brota da morte, como
a planta do grão, que se decompõe no
seio da terra. A morte se justifica
como um bem coletivo e dá
continuidade à criação. Os mortos
desaparecem para voltar ao mundo das
sombras e para fundir-se ao ar, ao
fogo e a terra. A morte é o regresso
à essência do universo.
Para
os astecas, havia uma crença que os
guerreiros mortos em combate ou na
pedra de sacrifício, morriam sob o
signo de "Uitzilopochtli" e
se convertiam em "companheiros da
águia", eleitos para
"acompanhar o Sol" do
nascimento até o meio-dia. E, as
mulheres mortas de parto, consideradas
como guerreiras pela luta e sofrimento
ao dar à luz, eram eleitas para
acompanhar o astro do meio-dia ao
entardecer. Mas, somente os homens, ao
término de 4 anos desta caminhada se
convertiam em aves de rica plumagem e
regressavam a vida terrena.
Ao
observarmos os mistérios da iniciação
do final do Antiguidade, verifica-se
que o candidato deveria suportar o
perigoso caminho através do mundo
inferior a fim de conquistar o
renascimento, verificamos que este
segue o mesmo caminho do sol dos
astecas. Assim, os iniciados nos mistérios
de Ísis, deveriam atravessar as doze
horas noturnas, as quais correspondem
na concepção egípcia ao caminho da
barca solar do mundo inferior.
A
verdadeira vida, para os astecas não
era aqui na terra e tinham que se
sacrificar para se fazer dignos da próxima
existência. É, portanto, somente
depois de uma vida de impecável
virtude, ao chegar à morte, o
guerreiro poderia acompanhar o
astro-rei em sua deslumbrante
caminhada. O asteca tinha como
verdadeiro objetivo chegar purificado
a morte, que não era outra coisa senão
a vida luminosa da consciência. Viver
para morrer, sofrer para viver
eternamente. Pensando desta forma, a
vida se apresenta como um verdadeiro
desafio, como também uma maravilhosa
oportunidade, um corredor que conduz
à porta da imortalidade.
Mas,
nem todos os homens possuem a força
espiritual, o domínio da vontade e a
mesma maneira de encarar a vida e a
morte. Por isso, existiam quatro
lugares para onde iam os mortos.
O
primeiro era o Ilhuicatltonatiuh, o
lugar prometido para os guerreiros, àqueles
que lograram o florescer de seu coração
e doavam-se como alimento.
O
Chichihuacuahco, o segundo lugar, era
para onde iam as crianças mortas,
elas se alimentavam em uma bela e
frondosa árvore de cujos galhos
brotavam gotas de leite. Estes
pequeninos voltarão ao mundo quando
este se destruir, dando término a época
denominada de Quinto Sol (época
atual).
O
terceiro lugar era Tlalócan, a
"Mansão da Lua", para onde
iam os que morriam de raios, afogados,
ou de doenças como: gota, sarna e
lepra. Este local era como uma casa de
veraneio, agradável e fresca onde
nada faltava.
Finalmente
existia o Mictlán, para onde iam
todos aqueles que não haviam alcançado
a morte luminosa do guerreiro, nem a
morte terna da criança, nem uma morte
associada à água.
Mictlán
era um lugar terrível, porque
significava o "nada", a
morte estéril produto de uma vida estéril,
a morte..por nada. Esta região era
governada por Mictantecutli e
Mictlancihuatl, Senhor e Senhora do
Mundo dos Mortos. Simbolicamente este
local era considerado o intestino da
terra.
O
morto para chegar a Mictlán tinha que
atravessar um longo caminho cheio de
perigos e passar primeiro por um
caudoso rio chamado Apanahuaya, para
tal feito, necessitaria da ajuda de um
cão chamado techichi. Posteriormente
teria que cruzar entre duas montanhas
que sempre estavam se chocando uma com
a outra (Tépetlmonamicitia). Devia
ainda enfrentar uma terrível
lagartixa de nome Xalchitonal e
escapar de um crocodilo. Também
deveria cruzar 8 desertos e subir 8
colinas e suportar um vento gélido
que cortava como uma navalha e o
jogava sobre as pedras. Depois destes
terríveis sofrimentos se encontrava
com Teocoyleualoyan, um imenso tigre
que lhe comia a coração. Então, após
ter concluído sua terrível e
dolorosa viagem, apresentava-se ante o
Senhor Mictlantecutli que lhe dizia:
"Agora que concluístes tuas
penas, podes dormir teu sono
mortal". Depois de 4 anos de
viagem, o viajante chegava a Mictlán,
onde simplesmente deixava de existir,
desaparecia.
Mictlán
era pois, um ponto de contato entre a
terra e o inframundo, porta de entrada
ao terrível mundo do NADA.
DEUSA
MICTLANCIHUATL

A
deusa Mãe da Morte é conhecida pelos
astecas pelo nome de Mictlancihuatl e
ela é chefe suprema dos anjos da
morte. É a única que nos liberta da
dor e da amargura. Ela nos retira
deste vale de lágrimas, com seu
imenso amor maternal, cheia de
caridade, adorável e bondosa. Os
astecas a representam com uma diadema
de 9 crânios, o 9 é o número da
iniciação.
A
importância do culto a Mictlancihuatl,
a Senhora de Mictlan, recai na esfera
de ação da morte. Ela devora o homem
como se observa na lâmina cinco do Códice
Borgia, aqui a deusa veste sua
fantasia de morta desencarnada,
inclusive em seu dorso podemos
observar suas costelas. Seu "cueitl
com prega na borda é branco,
possivelmente de papel, com a
estamparia simbolizando a Terra. Seus
brincos são de ouro com adorno de
papel. Atrás de seu corpo
distingue-se quatro bandeiras de papel
com franjas largas e compridas na cor
vermelha que qualificam seu aspecto
mortuário. A deusa se mostra na
atitude e posição para receber o
corpo do homem em seu seio.
Nenhuma
deidade como a Mãe-Terra pode ter o
poder absoluto da vida, da realidade
absoluta. Tudo que sai de seu seio está
dotado de vida e tudo que regressa à
terra, produzirá vida novamente. O
destino da terra é engendrar sem
cessar, dar forma a vida a tudo que
regressa à ela inerte e estéril. A
terra é o começo e o fim de toda a
vida. As mulheres, como a terra, também
geram a vida humana, a devolvem para
sua origem e possuem a capacidade de
fazê-la surgir de novo. A força
destrutiva e desintegradora, busca a
todo o momento, destruir para dar
origem a uma nova vida.
Mesmo
no México contemporâneo, ainda
existe um sentimento especial ante ao
fenômeno natural da morte e da dor
que ela possa produzir. Para eles a
morte é um espelho, para o qual
devemos olhar e nele se refletirá
tudo o que fizemos durante a vida. Se
a sua morte carece de sentido, é
porque sua vida foi vivida sem
sentido, pois a morte nada mais é do
que o reflexo da vida, o outro lado do
espelho.
Para
os mexicanos, a morte não é a vingança
da vida, mas sim a sua libertação
para os tesouros mais profundos da
nossa natureza.
A
MORTE É O SABER DO "NADA"
O
nada está a nossa volta
Tudo
que fazemos é
circunscrito
e inscrito do nada
Não
tenha medo do nada da morte
Pois
não há nada a temer
Nada
se cria se
Não
houver um espaço vazio para tanto
E
este espaço é o nada
E
se não houver este espaço
A
alma não pode despertar
Portanto
não há motivo
Para
se temer o nada
Pois
o nada faz parte tanto
Da
vida quanto da morte
Aceite
o nada como um presente
Que
ao abri-lo,
Terá
a surpresa de uma nova vida
É
o nada que transformou-se em tudo
Ao
se entregar ao nada
Você
ganhará a plenitude.
Rosane
Volpatto
|