COATLICUE, ARQUÉTIPO DA RENOVAÇÃO

Considerava-se a serpente como tendo o poder de
auto-renovação, por causa de sua habilidade de mudar e renovar a sua pele.
Este poder foi considerado semelhante ao poder da Lua que se renova todo mês
depois de sua morte aparente. O caráter sempre mutante, sempre renovador, tanto
da lua quanto da cobra, deu origem às crenças que atribuem o poder de
imortalidade ora à lua e ora à serpente. Diferentes mitos primitivos e antigos
relatam que o dom da imortalidade foi trazido aos homens ora pela lua e ora por
uma serpente. Em alguns mitos a serpente revela aos homens a virtude que está
escondida na fruta da Árvore-da-lua ou na bebida "soma", que dela pode
ser feita.
A cobra, tal qual a Lua, foi guardada por
virgens. Algumas jóias de oflito mostram Cibele, a grande deusa Lua, oferecendo
uma xícara a uma cobra sagrada. Em Espiro, no templo de Apolo, uma cobra
sagrada era guardada, talvez como remanescência de um culto antigo que os
Deuses do Olimpo usurparam. Essa cobra era alimentada por uma virgem que,
significativamente, tinha que estar nua enquanto executava o serviço. A grande
mãe-terra, Deméter, era guardada em seu templo, em Elêusis, por uma cobra
chamada Kychreus e uma união mística com uma cobra que provavelmente formou o
ritual central dos mistérios eleusinos da Grande-Mãe. Outro exemplo, Hécate,
a deusa da lua escura, era ela própria parcialmente cobra ou tinha cobras no
cabelo, como a Medusa, e dizia-se que Istar era coberta de escamas de uma cobra.
Dentre todos os animais do planeta, nenhum afetou tanto a imaginação
humana quanto a serpente.
Há mitos e crenças antigas afirmando que as cobras se
reuniam com as mulheres, podendo engravidá-las. Pensava-se também, em alguns
lugares, que a mordida de uma cobra era responsável pela primeira menstruação
de uma menina, e que as mulheres eram particularmente sujeitas a atrair "o
amor de uma serpente" quando menstruadas. Por este motivo, as mulheres de
algumas tribos não iam ao mato ou a uma fonte quando menstruadas, por medo de
ficarem grávidas de uma cobra. Em outros casos, ao contrário, faziam
peregrinações com o mesmo propósito a uma fonte onde se dizia viver uma cobra
sagrada.
Desde os antigos egípcios até os dias de hoje, a
serpente, tem sido parte integrante de muitas religiões e símbolo essencial em
muitos cultos. Como podemos perceber, o poder simbólico da serpente
afetou as culturas de todos os povos e deixou um rastro indelével nos sonhos da
Humanidade.

COATLICUE, DEUSA DA DOR

Coatlicue é a Mãe de todos os
deuses. Era também a deusa do sacrifício e adorada como a Mãe Terra, da vida
e da Morte. Sua representação geralmente é horrível, pintada como uma
mulher estranha, com uma saia de serpentes e ostentando um colar de corações
de sacrifícios.
Há diversas lendas sobre sua origem. Esta
Deusa, sedenta de
sacrifícios, tinha seios flácidos e afiadas garras nos pés e nas mãos. Mixcoatl,
a serpente das nuvens era seu marido.
Coatlicue, a Terra, mãe do deus Sol, Huitzilopochtli deu à luz em primeiro
lugar a Coyolxauhqui, identificada como a Lua, estando associada com um grupo de
400 deidades-estrelas, conhecidas com o nome de Huitzauna, que se encontravam
sob seu controle.
Alguns povos a chamam de
Coatlicue (saia de serpente), outros de Cihuacoath (mulher serpente) ou
Tonantzin (Nossa Mãe).
Conta-se que um dia Coatlicue encontrou
uma bola de plumas com penugem
branca na pirâmide onde estava varrendo e, colocando-as sobre o peito, ficou grávida. Quando os outros
400 deuses,
seus filhos, descobriram a estranha gravidez, juraram matá-la para impedir que o
recém-nascido sobrevivesse. Apenas sua amada filha, Coyolxauhqui, a Deusa da
Lua, avisou-a do perigo, mas acabou decapitada pelo Deus do Sol, por esta
atitude. Coatlicue, cheia de dor, colocou a cabeça luminosa da filha no céu,
onde se converteu na Lua.
A pedra com a
representação de
Coyolxauhqui foi descoberta nos finais do século XX no centro da cidade do
México, aos pés do que foi uma das grandes pirâmides astecas. Huitzilopochtli
saiu do ventre de sua mãe completamente armado e a salvou. Foi ele que cortou a
cabeça da irmã Coyolxauhqui.


ARQUÉTIPO DA VIDA E DA MORTE
Coatlicue é um arquétipo da Vida e da
Morte. Mas, arquétipo da Vida e Morte tem sido mal
interpretado por algumas culturas modernas. Entretanto, para outras mais antigas, esta Dama da Morte
representava uma pauta essencial da criação, pois é graças a seus amorosos
cuidados é que a vida se renova.
Em culturas como as das Índias Orientais e
Maias, a Dama da Morte envolve os moribundos, aliviando sua dor e os consolando.
Do ponto de vista arquetípico, a natureza Vida/Morte/Vida é um componente
básico da natureza instintiva. Mas boa parte deste conhecimento está
contaminada pelo nosso temor à morte. Vida e Morte constituem o ser humano. O
sentido que damos para a mesma, vai depender da nossa cultura e da sociedade em
que nos inserimos.

Para o pensamento pré-hispânico, sempre
existiu o princípio fundamental da dualidade. E segundo suas observações
cotidianas, estes povos chegaram a conclusão, que para a existência da
harmonia da ordem universal, a dualidade Vida-Morte era essencial. A morte segue
a vida, assim como da morte surge a vida do mesmo modo que a temporada da
chuva e vida seguia as secas e suas conseqüências: a morte. Portanto, o homem
deve morrer para que volte a nascer a vida. Daqui se retira a explicação para
os sacrifícios humanos.
O Dia dos Mortos é portanto, uma
celebração de raízes pré-hispânicas e moralidade cristã. É uma época
sagrada que requer que o homem pratique determinados ritos para ativar
magicamente as forças sexuais e reprodutivas da natureza. Os mortos ao
enterrarem-se entram para uma dimensão terráquea relacionada com a fertilidade
e com o mistério do renascimento. A morte, seria semelhante ao enterro da
semente que renasce e dá origem a uma nova vida.

Coatlicue chega até nós para nos ajudar a
entender a DOR. Ela nos diz que não existe modo ou maneira de fugir dela, nem
lugar que possamos nos esconder. O caminho da totalidade está em sentirmos à
dor e aprendermos com ela. Você tem medo de enfrentar a dor e passar pelo
processo de luto que ela trará? Você é daquelas pessoas que finge que está
tudo bem, enquanto que em seu peito sente a pressão da dor? Pois saiba que
você não está sozinho nesta, todos nós temos medo da dor e só a enfrentamos
quando estamos encurralados e não nos resta mais nenhuma saída. Muitas vezes
nos apegamos a uma situação que precisaria ser deixada para trás, com medo da
dor que isso nos causaria. Mas saiba que o medo é como um nevoeiro, não nos
deixa ver a realidade da vida. Ele descaracteriza e deturpa o aspecto de tudo.
Entretanto, quando sabemos o que nos amedronta, retomamos o poder que havíamos
investido no medo. Isso também separa o medo da noite do desconhecido, onde
vive todo o medo. O medo é algo que multiplica-se no anonimato, ele esquiva-se
a ter um nome. É imprescindível para o nosso processo de cura que não
tenhamos medo da dor. Se seu medo é um gigante amedrontador, peça ajuda à
amigos e familiares, compartilhe sua dor, mas não tenha medo de senti-la. A
vida está para as perdas, do mesmo modo que as perdas fazem parte da vida. As
estações mudam e tudo está sempre em transição. Mas tudo isso não é tão
bom? O que seria de nós se o inverno fosse eterno? Um período de transição
é sempre necessário e também muito saudável. E mesmo a dor, se encarada
dentro deste contexto, finalmente terá sua intensidade diminuída. Com o tempo
se sentirá forte e animada(o). Terá a convicção que um dia suas feridas
cicatrizarão. Lembre-se de que o processo demora o tempo necessário e de que o
tempo da tristeza é diferente. Coatlicue diz para você sentir a dor para que a
cura possa vir.

RITUAL À COATLICUE
Para este ritual você precisará de um
tambor e de baquetas.
Encontre um local em sua casa onde não
possa ser incomodada(o). Sente-se confortavelmente. Coloque a língua no céu da
boca, faça uma respiração abdominal, procurando encher completamente a
barriga e os pulmões. Inspire pelas narinas e solte o ar pelos lábios
entreabertos. Vá aumentando a intensidade respiratória por pelo menos 6 vezes,
mantendo a respiração constante e solte-se. Quando se sentir inteiramente
relaxada(o), conceda-se espaço e permissão para abrir-se à dor. Visualize em
seu corpo um lugar onde você está retendo sua dor. A maioria das vezes é no
coração e nos pulmões, mas pode ser também no plexo solar. Se você
conseguir e souber visualizar, deixe que as imagens venham.
Pode se tratar de uma dor recente ou
antiga. Pode ser até uma dor que está gravada em seu inconsciente e não
conhecimento dela, deixe qualquer emoção aflorar. Deixe que tudo venha à tona e aceite.

Assim que começar a sentir a dor é hora
de tocar o tambor. Toque-o do modo que achar melhor, ritmicamente e golpeando-o
cada vez com maior força. Deixe-se entoar a dor. Movimente-se para os lados,
para frente, tentando enlouquecer de dor. Quanto mais você conseguir se
envolver, mas satisfatória será sua experiência. Faça o que for mais
apropriado para você, mas entregue-se à sua dor e toque-a no tambor até que
ela se transforme em outra coisa. Não se preocupe, o seu cansaço fará com que
a dor transmute, pois neste momento você é uma guerreira(o) e está
travando uma batalha de morte.
Quando você tiver tocado
toda sua dor no tambor e ela estiver se transformado, deixe o tambor de lado.
Respire fundo e solte o ar devagar, inalando a energia que você despertou.
Agradeça e louve sua coragem. Talvez hoje você tenha transformado um galho seco
em uma sementinha de amor, mas na próxima vez você já terá um arado e muitas
sementes, tendo então a satisfação de uma colheita bem maior.
Texto pesquisado e
desenvolvido por

ROSANE VOLPATTO

 

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