CIGARRA, a estrela lírica

Canta cigarra,
Que a vida é curta
E tua cantiga
É teu pão de cada dia!
As lendas, fábulas e histórias estão recheadas de muitos bichos. A fábula,
principalmente, inspira-se em animais, racionalizando os irracionais,
emprestando-lhes qualidades humanas, com o intuito de moralizar, que é o fim
desses apólogos.
Algumas vezes,
entretanto, acabam por desmoralizar o pobre bichinho para o resto da vida, como o que fez La
Fontaine com a cigarra, apontando-lhe como mendiga, aliás por insinuação de
Esopo.
NADA MAIS INJUSTO! Pois a
cigarra que alegra com seu canto nossos dias de verão, não tem o porque de
mendigar, afinal, como a maioria dos boêmios ela se alimenta de seu canto,
aliás, nem canta (estridula), mas toca um tambor ressonante.
Seu aparelho sonoro está
colocado na base do abdome. São dois tambores em forma de concha. A membrana
desses tambores atua sobre um músculo especial aderido à superfície anterior,
que faz vibrar e emitir intenso e penetrante ruído, que varia de 1.500 a 4 mil Hz (Hertz). Há
ainda membranas que junto aos tambores dão ressonância àquela música.
Cada espécie possui uma
estridulação
característica e existem cerca de 30 delas conhecidas pelo homem. Mas, um
detalhe importante, é que só os machos "cantam", digamos assim, pois o aparelho
sonoro se acha ausente nas fêmeas. Este fato, levou um poeta grego e pouco
galante, a dizer "Ditosas são as cigarras, cujas fêmeas são mudas", como se a
tagarelice das mulheres não constituísse a música que nunca desejamos ouvir.
MAS PARA QUE "CANTAM" AS CIGARRAS?
O canto é um convite ao acasalamento.
Cada macho pode atrair até seis fêmeas.
As cigarras colocam seus
ovos em árvores, dos quais surgem as ninfas
que descem ao solo por um filamento
de seda. Penetrando na terra, elas se instalam nas raízes, a uma profundidade
média de 40 centímetros, sendo que algumas podem, através de cavações, alcançar
até mais de um metro de profundidade. Com um aparelho bucal em formato de
estilete, as ninfas sugam a seiva das raízes, eliminando o excesso de água. A
umidade do solo, mesmo em épocas de clima seco, é um indício da ação das
cigarras. Este estado larval, pode durar vários anos, tendo uma certa espécie
conhecida nos Estados Unidos que leva exatamente 17 anos para atingir a vida
adulta.
O abandono das raízes ocorre no final da
fase ninfa, quando elas sobem à superfície, deixando o solo perfurado. Saindo da
terra, elas se fixam a um suporte, que pode ser o próprio tronco da árvore
hospedeira, e iniciam sua fase ninfa imóvel. A duração dessa fase é de
aproximadamente 48 horas, quando ocorre o rompimento do dorso do inseto, por
onde sai a cigarra adulta. Presa ao tronco, permanece somente a exúvia (casca).
Este inseto, portanto, jaz nas trevas da
vida embrionária por longos anos para depois gozar as delícias da vida aérea
apenas alguns dias fugazes.
Bem tem razão a cigarra de celebrar
cantando os encantos dos dias de verão!
Devemos dizer a
ela:
Canta cigarra que a vida é curta!
Transmita aos homens que
se consumem
Em busca de uma inútil fortuna,
A tua sábia filosofia.
Canta para te desforrares
De tua escura vida subterrânea
Pois teu canto é alegria
Teu canto é teu pão de cada dia.
A CIGARRA NA MITOLOGIA
A cigarra é o inseto que foi consagrado
ao Deus Apolo, na Grécia, pela alternância de seu silêncio, à noite, e de suas
estridulações diurnas.
É, pois, um símbolo do par complementar
luz-escuridão. Pela mesma razão ela é também atributo dos maus poetas, cuja
inspiração é intermitente.
Já na fábula da "A cigarra e a formiga"
de La Fontaine, ela aparece como símbolo de negligência e de imprevisão.

A cigarra brasileira, possui
características e vestes tipicamente nacionais na criativa arte de Monteiro
Lobato. De acordo com a narrativa desse autor, a brasileirinha cigarra, faz
despertar no leitor a atenção e simpatia, pois ela não é considerada inútil e
possui a capacidade de encontrar saídas para os momentos difíceis de sua vida.
A figura da formiguinha também é
construída de modo bem diferente e reconhece o valor do canto da cigarra,
recompensando-a pela alegria que seu canto lhe proporcionou enquanto foi
obrigada a trabalhar duro. Na fábula de Monteiro Lobato, não existe arrogância,
mas sim uma ânsia de reconhecer na solidariedade uma moldura que torna nossos
dias mais profundos e resplandecentes.

No fim da fábula o canto da cigarra é
reconhecido como uma dádiva da natureza.
As narrativas criadas em torno da
cigarra, não podem ser consideradas sentenças morais, mas no levam a considerar,
que na vida atual, o dia é experimentado como uma gaiola, onde perdemos
juventude, energia e vigor.
Gaiola, porque grande parte de nossas
vidas são passadas no local de trabalho. Trabalho esse, que permanece fora dos
territórios da criatividade e do sentimento. É fato que necessitamos ganhar
dinheiro, não há escolha. Mas, por vezes, sentimos que nossa contribuição,
embora seja necessária e exigida, é meramente funcional e até mal apreciada. O
trabalho não deveria ser dessa forma, uma simples forma de sobreviver, pois
deste modo, ficamos presos a uma rede de previsibilidade e repetição.
Todos nós desejamos ser reconhecidos até
pelas pequenas coisas que realizamos, pois nelas colocamos todas nossas energias
e nossa expressão.
É através do trabalho que podemos fazer
de modo visível o reservado e precioso desconhecido que há dentro de nós. A
nossa natureza anseia profundamente pela possibilidade de expressão que
denominamos de trabalho. Mas é desolador pensar, que muitas pessoas tenham que
passar tanto de seu tempo consumidas por trabalhos negativos e destrutivos.
Acredite, só terão poder sobre nós, aqueles que lhes cedemos nosso poder. Não
devemos permitir que indivíduos exerçam poder sobre nós simplesmente porque
nunca os contestamos.
Seja verdadeiro, honesto e jamais deixe
que alguém desacredite sua dignidade. Essa máxima é aplicável a todas situações
de sua vida.
Texto pesquisado e
desenvolvido por

ROSANE VOLPATTO



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