Lenda da Alamoa

Era Fernando de Noronha, em tempos longínquos, um lindo reino encantado de fadas.

Havia na ilha uma rainha-fada loira, de beleza deslumbrante. Seu palácio magnífico, situado no alto de uma colina verde, era um eterno deslumbramento.

Todos os dias, das manhãs ensolaradas, a fada-rainha de cabelos cor de ouro passeava pelos seus vastos domínios, que seu poder cobria de palácios, de primavera e flores. Nunca faltavam, pendentes das ramadas, a policromia das inflorescências e a abundância das bagas amadurecidas. A renda das espumas do mar era um bordado contínuo em torno da ilha, uma delicada teia que se fazia e se desfazia.

Mas as quilhas das caravelas começaram então a sulcar e desvirginar as águas do Atlântico, além da linha do Equador. O Cruzeiro do Sul começou a ser avistado por olhos estrangeiros.

O reino encantado, desencantou-se. Os palácios foram convertidos em massas negras de basalto e suas galerias foram transformadas em rochedos.

Mas a fada-rainha loira não deixou sua amada ilha. Seu palácio soberbo foi metamorfoseado no Pico e hoje ainda vaga pelos montes e praias da ilha. Por vezes, surge montada em cães selvagens que vivem nos altos montes, como o morro Francês e o monte Espinhaço do Cavalo, soltando longos e sinistros uivos. É a fada-rainha Alamoa, que vai passando!

Todas às sextas-feiras, a pedra do Pico se fende, e na chamada Porta do Pico aparece uma luz. A fada Alamoa sai para visitar as redondezas. A luz atrai sempre muitas mariposas e também a todos que passeiam próximos ao lugar. Quando um desses se aproxima da Porta do Pico, vê uma mulher loira, nua, com o corpo coberto só pelos seus cabelos que descem quase ao chão.

Os habitantes de Fernando de Noronha chamam-na Alamoa, corruptela de alemã.

A Alamoa é uma fada que após a ocupação batava, no século XVII, resolveu vingar-se da invasão humana aos seus domínios. Aparece  a qualquer passante incauto como uma mulher extremamente sedutora e o chama com uma voz quente e apaixonante. Todo aquele que não resiste a sua fascinação é levado até a Porta do Pico. Entretanto, quando o homem escolhido está crente de ter entrado em um palácio, para usufruir das delícias daquele corpo fascinante, a Alamoa se transforma de repente em uma caveira. Os seus lindos olhos, que tinham o brilho das estrelas, agora são dois buracos horripilantes. A pedra do Pico se fecha e o louco apaixonado desaparece para sempre. A angústia de seus últimos gritos ainda ressoará por alguns dias, escapando-se das fendas profundas do monte e indo misturar-se ao uivo dos cachorros selvagens e ao silvo dos ventos do sueste.

 

Alamoa, de acordo com os relatos é uma fada solitária que teve penetrado, sem o seu consentimento, o seu reino encantado. O homem ao perturbar a ordem e a harmonia das coisas, atrai para si a hostilidade da natureza, sendo assim, a linda fada ofendida com a atitude humana, pode metamorfosear-se em uma bruxa repugnante.

A fada sabe o que é bom para ela e o que é bom para nós. Ela é o espelho de nossa alma, que pode ser bela ou feia, dependendo do nosso interior. Aceitá-la do modo que se apresenta, nos conduzirá para a grande realização de nós mesmos.

As lendas como a da Alamoa são tão naturais quanto a paisagem e devem ser cultivadas como um terreno sagrado. A dignidade, a beleza e a sabedoria das lendas não devem ser diminuídas pela arrogância do homem, pois são elas que habitam o eterno.

Texto pesquisado e desenvolvido por

ROSANE VOLPATTO

 

Bibliografia:

Sob o Sol dos Trópicos - Olavo Dantas. Livraria José Olimpio Editora, RJ, PP 27-31

Estórias e Lendas do Norte e Nordeste - Paulo Dantas; Gráfica e Editora EDIGRAF Ltda; SP

 

 

 

 

 

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